Sobre a auto-afirmação com fala e escrita

Como devem ter percebido, a nossa linguagem escrita é ensinada como uma extensão da fala, pois se organiza foneticamente: mesmo palavras desconhecidas podem ser pronunciadas, pois basta que identifiquemos os fragmentos.

Em teoria isso até que funciona, mas na prática vemos que a linguagem falada simplesmente não se equipara com a escrita: nós buscamos meios para acelerar a fala, e daí surgem abreviações cotidianas.

No inglês existe Because, que falam cause. No português você, que falam ce, está, que falam ta.

A linguagem falada parece buscar caminhos para abreviar a comunicação, já que isso maximiza a eficiência da comunicação em si, mas a linguagem escrita só passou por esse tipo de transformação quando chegou a internet. O problema é que as abreviações são tão bizarras e pessoais que muitas vezes dificultam a interpretação, coisa que nunca acontece na fonética cotidiana. O que você entenderia lendo “qq”. Eu levei cinco segundos para entender, pelo contexto, que significava qualquer.

Partindo daí poder-se-ia justificar a repulsa com que o internetês foi recebido. Usar abreviações com lógica fonética como “c” para você, e q para “que” até que faz sentido, mas pela internet você vê tantas aberrações que simplesmente não tem como aceitar essa desordem na comunicação.

Estou longe de ser um conservador, mas as pessoas que criam essas aberrações geralmente não pensam se isso facilitará a comunicação. É simplesmente inadmissível.

Mas existe o outro lado da moeda, que é a auto-afirmação através da linguagem: tanto escrita quanto falada. Eu diria que a feita através da fala é mais grosseira do que a da escrita, mas isso deixo para que cada um julgue.

Na escrita vemos um texto jurídico, que é preparado obviamente para dificultar a interpretação de uma pessoa não habituada ao tipo de leitura. Como observar essa linguagem é algo cansativo, só quem se esforça por se acostumar com ela que interpreta perfeitamente bem o que está escrito: é rebuscado.

Esse tipo de escrita pode ser considerado por alguns como sendo erudita, mas não passa de uma fraude. Uma farsa que algumas criancinhas de terno usam para intimidar os outros e dizer: viu como eu sou inteligente? Eu escrevo difícil e entendo quando escrevem difícil!

Na maioria das vezes o significado do que está sendo escrito é simples, porque uma pessoa que concentra sua energia em complicar a forma de um texto e dificultar sua interpretação dificilmente terá energias sobrando para, junto a isso, criar um significado digno de interpretação. Pegam coisas simples, usam palavras totalmente desnecessárias e incomuns que, “por acaso”, são difíceis de pronunciar foneticamente, e se dizem inteligentes, homens cultos. Pra mim um homem culto deveria saber expressar a idéia mais complexa de forma simples. Mas, infelizmente, isso não dá lucro e também não ajuda na manutenção do sistema, então não vejo perspectiva de mudança.

Além desses, há aqueles que usam a fala como auto-afirmação. Assim como os primeiros, eles memorizam palavras pouco conhecidas para fingir erudição, mas a comunicação deles é ainda mais bizarra. Imagine uma pessoa falando: “siga-me. Estou indo ao banco”.

Se você ri ele enche o peito (a mente) de ar e diz: “mas isso é o correto!” com um ar de superioridade que diz: você é burro e não sabe falar.

Pois isso acontece: há pessoas que fazem questão de pronunciar as coisas faladas exatamente da forma que são escritas simplesmente para dizer a alguém (provavelmente a si mesmos) que não são idiotas. Mas adivinha só: são idiotas!

Pior é quando a pessoa não conhece nem a norma culta e tenta fazer isso. Aí começa aquilo de “adêvogado”, etc.

São estúpidos demais para aplicar as palavras para o que elas realmente servem: expressar significados. Para eles basta que o texto/fala seja emitido da forma mais complicada possível. Falam de forma ineficaz, escrevem de forma ineficaz e, no final, concentraram tanta energia em fingir serem inteligentes que se tornaram toupeiras!

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