Meu irmão e eu no reino das trevas


Eu estava no inferno novamente. Dessa vez eu cheguei até a mesa onde Mefistófeles e o velho estavam me esperando. O velho estava tenso e eu sentia que possuía uma mensagem em mim para ele. Não sabia muito bem que mensagem, mas tinha que deixar fluir das profundezas do meu ser.

-    Porque, irmão? Porque você me abandona? – perguntou o velho.
-    Não te abandono. Você está enganado.
-    Você está me deixando sozinho. Você fez um pacto de que não me deixaria sozinho aqui!
-    Irmão. Você deixa a si mesmo sozinho. O tempo de aprendermos sobre a destruição acabou. Precisamos agora continuar nosso caminho. Precisamos deixar a corrente nos levar para novas possibilidades.
-    Eles te contaminaram. Você devia ter impedido isso.
-    Não. Não devia.
-    Eu não posso continuar sem você. Será que não entende? Nós representamos o equilíbrio do universo!
-    Você está perdendo o contato com sua essência, irmão. Não percebe? Mefistófeles não é você. Não é a sua função manter o equilíbrio. – eu falei sem muita consciência do que isso queria dizer.

Mefistófeles me jogou a carta e eu peguei com a mão direita. Quando a passei pra esquerda ela desapareceu. O anel a destruiu.

-    Viu? Em breve esse anel terá te profanado tão profundamente que você já poderá voltar ao inferno. Eles te querem como um escravo, você sabe disso.
-    Não. Sou eu, irmão. A minha essência mudou nesses milênios. Eu já não sou aquela criatura destruidora que fez o pacto de servir a desintegração. Nem você.
-    Você está perdendo o juízo. A energia deles está tomando conta do seu ser.
-    Não. A totalidade está tomando conta do meu ser.

Eu levantei minha mão direita e mostrei a ele. Minha pele começou a envolver o anel de Mefistófeles. Ele se acoplou de tal maneira em mim que nos tornamos um.

-    Você é um só. Como pode ter essas forças dentro de si? Como pode ter todo o universo na sua alma e sua alma em todos universo? Como!?
-    Eu parei de perguntar como e deixei o meu corpo flutuando no cosmo. Aí os fluidos da natureza, os que caminha para a totalidade, me mostraram o caminho. Não é um caminho a ser controlado e entendido, mas a ser sentido e vivido. É o caminho para o infinito.
-    Então era esse o convite. – disse o velho ao jogar as cartas na mesa.

Mefistófeles não falava sequer uma palavra. Ele não é um ser humano, mas uma força do universo. Não pode deliberar. Ele só é.

-    Você também o recebeu, irmão. Junte-se a mim. – disse eu com esperança.
-    Não posso. A minha alma e Mefistófeles estão fundidos. Eu fiz isso para que você pudesse ser livre.

A mesa voou e eu vi a perna direita dele. A partir do joelho ela deixava de ser a perna dele e passava a ser a de Mefistófeles. Os dois permaneciam na mesa daquela maneira porque suas pernas estavam presas como que cirurgicamente. Por causa daquilo ele só poderia trilhar o caminho do diabo. Uma voz rouca, a minha voz, gritou perguntando quem eu era. Eu perguntando a mim mesmo como se eu fosse outra pessoa.

-    Meu tempo está acabando. Irmão, Encontrarei gaia. A encontrarei e você será livre. Eu prometo.

O velho me olhou com um olhar de quem não gosta da idéia, mas que ao mesmo tempo parece aceitá-la. Fui puxado para fora do inferno e o portão se fechou. Não seria pelo portão do tártaro mais o meu caminho. Tantas vezes o trilhei, mas isso tudo ficou no passado. Agora era a hora de buscar as respostas. De encontrar Gaia. Mas o mundo balançou e eu fui convocado à realidade.

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