Águas passadas


A noite estava escura. Chovia, mas estava quente. Saiu de casa carregado por um impulso de não se sabe o que. Nem sabia pra onde estava indo, mas lembrou que sempre que saia assim acabava lá pro fim da praia. Subiu, como sempre as escadas altas que levavam à cachoeira e lá do topo não conseguia ver nada por conta de um poste jogando luz em seus olhos. Mas nem queria ver nada mesmo.

Desceu na água gelada e sentou no ultimo degrau. Era grande, nem dava pra subir por ali. A água caia e passava por suas pernas. Onde ele sentou, acabou formando um ponto sem água. Foi só ele chegar que a água se retirou. Que ironia...
Era uma corrente baixa. Do tamanho de um dedo, mais ou menos. Dava pra deitar naquele chão cheio de lodo e sentir a água gelada fluindo. Seria esse um real motivo de sofrimento, talvez. Quem sabe a água não seria a fonte de purificação?
As gotas da chuva já estava cessando, mas já haviam se acumulado nos olhos. Ele só via vultos.

Lembrava que quando menino era tudo menos complicado, só mais doído. Agora já nem sabia se doía por saber que deve doer ou se dói de fato. As árvores viraram nuvens que respingavam o que sobrara da chuva, parecia até uma clepsidra do relógio natural, pingava cada gota fazendo questão de chocar-se contra as rochas do pensamento. Esse aí saía da cachola devagarinho, ia rastejando pelos musgos até achar uma altura boa para pular para o ombro, aproveitava uma cicatriz ganhada de uma queda da mangueira plantada nessas chácaras que só avó tem para penetrar sangue adentro, só parando no coração.

A água gelada eriçava as costas enquanto contornava cada curva de pele para reencontrar-se consigo mesma, já o lago parecia borburlhar de tão agitado, talvez fosse isso. Lago borbulhante faz a cabeça borbulhar também. E a dele já estava fervida há muito tempo. Tinha perdido um chinelo, o do pé esquerdo, por que sempre tinha que acontecer com as coisas canhotas da gente?

Levantou a cabeça devagar e viu o chinelo caindo pelos degraus. Caiu num canto que era impossível visualizar. Andar descalço sempre foi bom, de qualquer maneira. E aquele chinelo estava velho. Soltou o outro do pé, mas ele agarrou perto e não foi. Como certas feridas que, diferente das outras não são levadas pela correnteza do tempo. Tem algumas que ficam. Perder esse seria uma desculpa pra comprar um novo, mas voltar só com um provavelmente seria motivo pra vir procurar o outro e continuar com o velho. Mas o velho tinha que ir embora, então ele o lançou no meio do mato.

Sei queixo tremia. Tudo tremia naquela água gelada. Será que com alguém ali junto seria tão frio? Será que seriam dois tremendo? Ou seria o calor de um o bastante para o outro?

Ele nunca abraçou ninguém dentro d’agua, então não sabia, mas quis acreditar que sim.

- a vida é dura. – disse ele em voz alta

Parecia imaginar que alguém o ouvia. No fundo se sentia um covarde isolado e se lamentando. Só que as crianças da áfrica não serviam pra amenizar seu sofrimento: pelo contrário. Saber que há pessoas sofrendo tanto o fazia sofrer ainda mais. Tinha em seus ombros o próprio peso e também o do mundo.

Acerca da farsa que é a estrutura do pensamento cristão


Foi um belo banquete, ontem. Se é que posso dar esse nome ao jantar de natal. Infelizmente o meu bom senso foi agredido, pois tive que me sentar e ouvir um ritual cristão.
Interessante, aliás, é que o sermão foi retirado de um livro chamado pérolas diárias. Será que não seria uma pérola negra demais dizer que o Natal é uma comemoração originada na cultura pagã, celebrando o deus sol?

E cadê a solidariedade de um feriado criado exclusivamente para o consumo excessivo, que amplia a segregação social e, conseqüentemente, não tem nada de bonito?
Eu estava quieto na minha. Mas a agressão foi grande demais: colocaram um CD com músicas evangélicas para eu ouvir. Um insulto para mim, que já estou a algum tempo tentando trabalhar nessa minha aversão ao cristianismo.

Mas essa praga está em todas as esquinas, em todas as ruas. Não há como eu me livrar do ódio ao cristianismo se sempre tem um maldito reforçando esse sentimento com alguma gritaria ou algum discurso obviamente idiota, que os ouvintes parecem considerar totalmente razoável.
Que fique claro, no início desse texto, que se trata de uma catarse: só estou escrevendo isso pra aliviar minha raiva, o que não quer dizer que o conteúdo em si seja falso.

Minha intenção aqui é demonstrar, numa análise da estrutura lógica do pensamento cristão, que ele se baseia numa farsa, se desenvolve numa falácia e chega no absurdo.

Primeiro devemos considerar as premissas.

1)    Deus existe.
2)    É onisciente, onipresente, onipotente e bom.
3)    Jesus morreu pelos pecados do homem.
4)    A bíblia é sua palavra.

1 – A mim parece mais do que óbvio que esse argumento simplesmente não pode ser justificado, tendo em vista que vai para além do empirismo. Há certos argumentos usados pelos cristãos, no entanto, que eu gostaria de comentar.

Em primeiro lugar, muitos usam uma falácia básica, que é tornar úteis para a sua causa as teorias da física (ou uma distorção dela). Presumem que deve haver uma força criadora, porque não há como tudo ter surgido do nada. Depois dessa pressuposição, dão um enorme salto e dizem que essa força é Deus, e que ele é o que a Bíblia mostra.

Ora, nós nunca estudamos nada relativo à criação. Tudo o que observamos são mudanças na matéria que já existe. Assim, nossa lógica no que se refere á matéria em si nunca englobou nada parecido com criação. Daí decorre que a física não poderia justificar a criação, já que isso não é algo observável. Nunca presenciamos a criação, apenas a transformação.

Daí decorre que nada nos garante que o universo teve que ser criado em primeiro lugar. Ele poderia muito bem ter sempre existido: a força criadora poderia ser o próprio universo. E mesmo que tenha sido criado, considerando essa possibilidade real, embora incomprovável, nada nos garante que tal força seja inteligente da maneira que entendemos o conceito de inteligência (qual?).
Outro argumento comum utilizado pelos cristãos, geralmente com o intuito de fugir do assunto e encerrar o diálogo, é o de que o indivíduo precisa “sentir” para entender. Só que esse sentir, o qual eu mesmo experimentei, é completamente irracional: é uma sensação boa que pode ser interpretada de diversas maneiras. Daí decorre que, mesmo sentindo o que eles chamam de presença de Deus, eu posso dar a essa sensação outro nome. Acontece que eles têm a sensação e a interpretam com as premissas cristãs, que aceitam sem nunca terem sentido nada. E depois têm a cara de pau de usar essa mesma sensação para comprovar a premissa de que Deus existe.

É uma falácia lógica parecida com a usada para comprovar a bíblia: a conclusão é a premissa, o ciclo é fechado e a mente do indivíduo também. Ele só pode fazer, depois disso, alguns ornamentos para tornar o argumento menos inteligível, o que coage os mais ignorantes a aceitar sem questionar com medo de serem segregados como burros demais pra entenderem os “mistérios de Deus”. Mal sabem que assim eles demonstram sua estupidez integralmente.
Mesmo que essa sensação tenha origem em Deus, não há conteúdo racional nela: não há dogmas, não há bíblia, não há profecias e nem dízimo. Isso é o significado que o individuo já carrega consigo e que vomita sobre a sensação para dar a ela algum sentido (porque é preferível dar um sentido idiota do que não dar nenhum).

A Bíblia também é usada, de maneira sofrível, como forma de demonstrar que Deus existe. E é precisamente Deus que dá alguma credibilidade a ela: O ciclo fechado e meramente abstrato, sem nenhum tipo de empirismo.

Outro argumento absurdo é o de que, pelo simples fato de que o cristianismo é antigo, deve ser verdadeiro, porque se fosse uma mentira não se manteria por tanto tempo (E isso é uma falácia lógica formal). Acredito que é bem fácil citar religiões mais antigas que o cristianismo e que ainda existem. De fato, o cristianismo só se mantém diante de outras religiões por dois motivos: porque é uma religião “demonizadora” e fundamentada em sofrimento.
Noutras palavras, o cristianismo torna herético e profano todo o conteúdo religioso que não seja o seu. É precisamente essa a idéia que deu fundamento às cruzadas e que motiva crentes a irem para a áfrica livrar a população local das crenças demoníacas. Aliás, para um cristão é totalmente razoável o fato de que a áfrica está miserável: é falta de Deus.

Já ouvi pessoalmente uma mulher cristã dizer que a Inglaterra é um país rico porque é cristão e que a áfrica é como é por conta da idolatria e do culto á demônios. E mesmo para cristãos cultos, não há como negar que isso é razoável se estivermos partindo das premissas cristãs.
Outro ponto que sustenta o cristianismo é sua raiz no sofrimento: é uma religião dos oprimidos, que são sempre a maioria. Funciona como a hydra, que foi enfrentada por Hercules: quando se corta uma cabeça, nascem duas. E o cristianismo é assim: sempre que alguém se revolta contra os absurdos e as barbaridades do cristianismo e decide lutar contra essa religião, eles mostram na bíblia que Deus previu as perseguições e usam isso como argumento para justificar sua religião. Lamentavelmente, isso é aceito como prova por muitas pessoas. Podemos ver isso claramente nos cristãos que morreram sem reagir nos coliseus quando o cristianismo era perseguido. Era como coçar sarna: quanto mais você tenta ferir, mas espalha a praga.

Foi um tipo de maldição que ninguém conhecia. Uma força que cresce quando é perseguida e que usa a morte para se reproduzir.
Será mesmo que o cristianismo se mantém porque Deus está trabalhando?
Pra mim parece que o cristianismo só existe porque é uma praga bem resistente.

2 – Acredito que nem é necessário me aprofundar muito nas características de Deus, porque nem há comprovação de que ele existe em primeiro lugar. Mesmo assim, como estou escrevendo isso por mera catarse, vou explorar tais argumentos.

Em primeiro lugar, usemos a lógica abstrata: se Deus é onisciente e onipotente, isso que dizer que não existe, para ele, a barreira do tempo. Assim, Ele está no passado, no presente e no futuro.

No entanto, ele criou uma “palavra” que tem como intuito “salvar o homem”. Ora, por que motivo ele tentaria salvar homens que ele mesmo criou já sabendo que seriam condenados?
E, em última análise, de quem o homem seria salvo senão do próprio Deus, já que tudo é criação dEle(inferno, diabo, etc.)? E que pecados o homem tem que evitar senão aqueles que Deus mesmo criou?

Como pôde Deus mandar o rei Saul matar crianças de peito se é bom? Porque Ele mesmo não os matou com relâmpagos? E, aliás, já que esse povo entrou em seu caminho, porque ele permitiu que ele viesse a existir, já que sabia do destino inevitável?

Deus não sabia, então não pôde se previnir. Daí decorre que não é onisciente e nem onipresente: não sabe do futuro porque nunca quebrou a barreira do espaço/tempo e nunca saiu do presente. Deus mandou matar as crianças, que mais tarde veio santificar, então não é bom (seria mais caridoso nunca tê-las criado). E Deus não podia destruir os amalequitas, tendo que, então, usar o rei Saul (afinal, Deus não passava de um profeta disfarçado com truques estúpidos).

Noutras palavras, mesmo se Deus existisse, tais eventos precisariam de sofismas para terem alguma aceitação, porque são uma fraude. Tudo ali indica que, pela antropomorfização, pelos sentimentos humanos e pelo pensamento humano (preso no espaço/tempo) não há nenhum deus falando, mas apenas um homem (ou alguns homens) que inventa coisas ou que tem delírios proféticos.

3 – Como essa uma das partes mais absurdas do cristianismo, sendo, curiosamente, a parte principal, separei uma parte do texto só para demonstrar essa farsa com cuidado.
Como já demonstrei, nós fomos condenados pelo senso de justiça criado por Deus e Ele já sabia da nossa condenação antes de nos criar. Daí decorre que se temos que ser salvos de algo é do próprio Deus, opressor e egocentrista.

Mas não para por aí o absurdo: Nós somos obrigados a responder pelo erro de outra pessoa, sendo que nascemos inocentes (segundo a premissa cristã). Não preciso dizer como é absurda a idéia de um filho pagar pelos erros do pai. Quanto mais pagarmos pelos erros de pessoas que nem sabemos se existiram de verdade (sem presumir que a bíblia seja verdadeira literalmente).

E a parte mais absurda chega agora: depois de sermos condenados por um erro que nunca foi nosso e que foi definido como erro pelo nosso próprio salvador (algoz), ele mandou o próprio filho para morrer (sendo imortal) pelos nossos pecados.

Pra colocar de forma mais simples, poderíamos dizer que isso seria como se um juiz decidisse absolver um criminoso entregando o próprio filho para morrer em seu lugar. O que tem a ver a morte do filho com os supostos crimes do bandido? Porque a morte do filho salva o vigarista?
Ora, é claro que na antiguidade eles matavam cordeiros como uma forma de sacrificar parte do que tinham, a fim de, com tal penitência, expiar os pecados. É estúpido, mas era o que era.
Só que Jesus nunca foi um cordeiro (uma propriedade do pecador, que ele entregaria como forma de penitência) e nunca morreu. Afinal, era imortal!

Toda esse estória é tão absurda que eu ainda fico indignado com a freqüência com a qual é aceita pelas pessoas sem nenhum juízo racional a respeito: Deus inventou o erro, nos criou para errar, nos condenou com sua própria criação e se propôs a nos salvar dele mesmo mandando o próprio filho para ser sacrificado. Não é necessário ter boa vontade para acreditar nisso: o que se precisa é ser idiota!

4 – Um pouco pior do que a farsa do sacrifício de Jesus, a bíblia é a maior farsa do cristianismo.
Como demonstrei, é sustentado que ela é a palavra de Deus. E ao mesmo tempo é ela mesmo que prova a existência de Deus. Assim, se eu criar um livro sobre o unicórnio rosa invisível e disse que foi o próprio unicórnio que o inspirou, então o unicórnio existe e o livro é sagrado.
O mais funesto detalhe sobre esse livro é que ele é usado por cristãos como fonte de informação! Ou você nunca viu um cristão confirmar qualquer absurdo quando são apresentados fundamentos bíblicos?
Através desse livro, o homem se convence de que está sempre culpado, que é miserável e precisa do auxílio de deus (ególatra), que tem que pagar dízimo, fechar sua mente para idéias contrárias, pregar o cristianismo, perseguir e demonizar outras religiões, e pior que tudo isso: ele é forçado a negar sua própria natureza, que, estranhamente, foi criada por deus. É obrigado a fechar os olhos, negando sua razão, e ao se entregar ao ascetismo, lutando contra impulsos naturais, como o sexo. E o inferno é a ferramenta de coação. Uma ferramenta estúpida, mas assustadora e tristemente eficaz.
Na verdade esse livro é uma das maiores pragas que já existiram nesse planeta. Alienador, castrador: ele controla com facilidade as massas imbecis que caminham pelo mundo e trás lucro a que souber utilizá-lo.

Não vou ser irresponsável ao ponto de não demonstrar cada uma dessas acusações. Só espero que os leitores consigam entender minha lógica cíclica: não sou bom com pensamentos lineares, então há coisas que já foram ditas e serão aqui reforçadas.

Depois de ignorar todas as falhas do cristianismo, que torna a bíblia legítima, começam as conseqüências funestas dessa religião. O sentimento de culpa corrói o indivíduo, impedindo que sua razão se desenvolva. O senso crítico só é permitido quando se encontra dentro dos limites do que o cristianismo já prescreveu como verdadeiro. Se ele ousar sair dessas premissas, muitas vezes não será necessária nenhuma força externa, porque o verme cristão da culpa irá corroê-lo. O medo do inferno, que é um mito originado na bíblia, sustenta tal sentimento de culpa e coage o indivíduo a nunca sair do pensamento cristão. Assim, isso se torna uma prisão para o pensamento humano e para seu desenvolvimento intelectual.

Como o ser humano é essencialmente social, é comum que ele precise se integrar com outros para que não se sinta demasiadamente pequeno e impotente. Nos dias de hoje, tal sentimento é comum, porque nossa sociedade é individualista e se baseia em interesses materiais para seu funcionamento: De um modo geral, as pessoas só vivem perto umas das outras por necessidade. Assim, muitos se encontram sozinhos no meio da multidão, já que as pessoas não passam de ferramentas.

Essa ferida aberta pelo nosso sistema deixa um buraco na alma do indivíduo, que o cristianismo trata de associar à falta de Deus. E quando o indivíduo se engloba na igreja, acaba fazendo parte dessa comunidade e tem seu vazio preenchido. Afinal, se fosse por conta de Deus, o mais razoável seria o indivíduo buscar a Deus por conta própria ao invés de se submeter a uma instituição. Eu nem imagino quantas pessoas estão na igreja simplesmente porque é lá que se firmaram e não saem pelo medo da solidão. Mas sei bem como a segregação à qual são submetidos os “desviados”. No início tentam converter o indivíduo de todas as maneiras, com músicas e com frases de efeito. Tentam novamente usar os próprios membros e a sensação de pertencer à comunidade. Se nada disso funciona, o indivíduo simplesmente deixa de existir. Deixam “Deus lidar com ele”, e se ele começar a falar contra o cristianismo, devem manter distância dele, porque está sendo usado pelo inimigo(Diabo). Isso no caso dos cristãos mais pacíficos, porque os mais selvagens podem tomar medidas mais drásticas: a agressividade de alguns cristãos beira o terrorismo, sendo que a máxima dessa religião é “amai ao próximo como a ti mesmo”.

Assim, mesmo que os membros do grupo tenham alguma simpatia pelo indivíduo, ela não se manifestará senão em orações, que não podem remover a solidão e a revolta do excluído.
Com fundamento na bíblia (que piada), o líder espertinho lança o dízimo em questão. Cria músicas que endeusam a prática, mostram como é importante para o crescimento da obra de Deus (que, aliás, criou tudo e, conseqüentemente, tudo possui). Mas o principal absurdo colocado nesse sentido é o de que quem dá dízimo se torna prospero.
Sempre procuram um exemplo para dizer que o dinheiro rende mais quando se paga o dízimo, mas nunca se lembram que a maior parte das pessoas que o pagam nunca saem da miséria: as comunidades cristãs se multiplicam feito praga onde há pobreza. Nunca lembram da enorme massa ignóbil que está cagando pra todos sofismas cristãos, mas que só dá a Deus pra receber de volta (e nunca recebem). Aliás, lembram sim. É muita coisa pra esquecer. Apenas não falam sobre isso por ser ruim para os negócios. Só cantam musiquinhas, dizem que Deus ficará contente e que o que o “servo” doar (colocar no bolso do ladrão) retornará para ele multiplicado em dez vezes.

Roubar assim é bem mais fácil do que bater carteiras ou usar armas, não? Usando todo um mecanismo imundo que já existe desde que o homem aprendeu que pode mentir para o outro em troca de benefício material pessoal.

Para se sustentar, é claro, o indivíduo precisa não só fechar a mente e continuar repetindo exaustivamente as mesmas besteiras pra si mesmo: ele também faz isso para com os outros, imaginando que, ao ouvir, os outros acreditarão. E não está errado: porque a maioria das pessoas simplesmente acredita sem nenhum tipo de questionamento. Só porque alguém falou e essa pessoa é “confiável”. Às vezes nem isso: só porque muita gente disse, não importando quem sejam as pessoas.

O mais engraçado (pra não dizer trágico) é que alguns protestantes pregam porque dizem que só quando todas as pessoas tiverem ouvido a palavra de Deus é que Jesus (a ovelha sacrificada) voltará para levar os cristãos que foram fortes na fé (que se alienaram com maior força de vontade) sendo o paraíso a recompensa para os alienados, manipulados e estúpidos, que nem mesmo percebem que o paraíso, no qual não há barreiras, eles mesmos sofreriam com um tédio eterno, enquanto que a dor do inferno passaria com o hábito nalguns milênios.

Outra coisa notável é como usam os eventos da modernidade para afirmar que profecias se cumpriram e que “A bíblia estava correta”. Sobre isso nem há muito o que dizer: a linguagem utilizada pela bíblia permite diversas interpretações. Isso sem falar no fato de que ela já foi tão alterada que provavelmente nós não vemos hoje um terço do que esse livro já foi. Por mais que, de qualquer maneira, não possua qualquer valor para além do simbólico e psicológico.
E o mais deprimente é que, quando se percebe que os “sinais do fim” se cumprem, acaba por sentir em seu íntimo algo como alegria, pois eles não se importam com esse mundo e pensam que serão arrebatados pela ovelha imortal que morreu para pagar pelos erros alheios.

E por último e mais terrível, prega a negação do que o ser humano é em essência: dizem para não fazermos sexo antes do casamento, o que era razoável antes de termos a camisinha como forma de controle de natalidade e de refrear a praga de DSTs (Isso nunca funcionou de verdade, porque o impulso sempre foi mais forte). Com isso, nos ensinam e ter medo do que somos e a sofrermos por conta da nossa própria natureza. O homem não pode pensar e não pode transar sem se sentir culpado. Por causa disso, surgem casamentos falsos, onde a pessoa simplesmente quer ser autorizada a transar e a relação não vai para além disso. Quando ele percebe a farsa que é seu casamento, quer destruí-lo (mesmo inconscientemente) e começam as brigas, que, é claro, são atribuídas ao Diabo. Aí começa a terapia cristã de casais, que tem como objetivo salvar um casamento que já iniciou fadado ao fracasso. Aliás, o romantismo apresentado nessas terapias é tão ridículo que dá vontade de rir (cenas de beijos recortadas de filmes famosos com música gospel no fundo).

Não existe pensamento criativo dentro do cristianismo, já que há os limites do dogma para o que pode ser pensado. Quando sempre temos que ter cuidado para não blasfemar e para não violar a sagrada moral cristã, acabamos reprimindo nossa criatividade, que não se submete ao maniqueísmo. Precisamente por isso que os maiores artistas demonstram estar além da prisão cristã, enquanto que quem está preso não conseguiria sair do lugar com uma obra de arte: mais cedo ou mais tarde o cristianismo impediria o indivíduo de ser criativo, porque em sua concepção algo surgiria que o cristianismo não aceita. Aliás, algo natural (o cristianismo considera a natureza um erro, e precisamente por isso tenta fugir dela com paraísos e ascetismo).

A arte é limitada, a sexualidade é limitada, a ciência é limitada, a filosofia é limitada. Tudo por causa de premissas que nunca foram provadas em primeiro lugar, que dão base a um desenvolvimento repleto de falácias e que nem levam às conclusões propostas sem um enorme salto (que acontece por meio da fé).
A fé move o ser humano à estupidez. E não adianta querer colocar sofismas na frente da fé e dizer que ela se alia à razão: o que vemos da fé é que ela aliena as pessoas e faz com que elas acreditem em qualquer besteira que disserem. Pela fé no monstro do espaguete voador, no unicórnio rosa ou em Deus, o indivíduo pode ser curado psicologicamente. Porque a mente do ser humano atua sobre seu corpo de forma muito intensa. Não Deus, Psicossomática, placebo...
Afinal, não é só no cristianismo que vemos curas milagrosas e sincronicidades, mas em praticamente todas as religiões. Aliás, as mesmas religiões que o cristianismo atribui ao diabo. Os milagres delas, por conveniência são fruto da ação do diabo (que quer matar, roubar e destruir, como Deus fez com o Egito) e os que os cristãos recebem são de Deus.

Com minha catarse completa, deixo aqui registrado que o cristianismo é uma praga e precisa ser eliminado do universo. Mas no fundo eu penso que isso é só um sintoma. Se tirarmos o cristianismo, teremos outra religião, ideologias sociológicas ou qualquer outra besteira que o ser humano quiser usar para se esconder em convicções e fingir que tudo está seguro.
Convicções são prisões.
Bem disse Nietzsche...
O ser humano tem medo de liberdade.
Bem disse Fromm.
Está alienado de si mesmo e projeta o que tem dentro de si no mundo de for.
Bem disse Jung...

Os sábios sempre surgem e sempre apontam os erros. Não estou falando novidades aqui. E também não é novidade que a imbecilidade inflará o ego e não aceitará a derrota.

Foi só um momento


Foi um dia longo pra nós dois. Mas foi bom. Passeamos por aí. Não conheço o nome dos lugares pra me lembrar e nem importa também. O que importa é que foi um bom passeio.
E eu nem gosto de passear.
Chegamos à casa dela. Barulho de cachorro vindo do quintal. Adoro cachorro.
Entramos no quarto dela e eu deitei na cama. Tão fofa. Não era daquelas que arrebentam a coluna. Era boa mesmo. Melhor que a da minha mãe, que sempre achei que fosse a melhor do mundo.
Ela abriu o notebook, mas fechou. Sentou na cama e me olhou.

- Olha, Silvana, eu não sei não. Você é bonita demais. Isso pode acabar de uma maneira que você não vai gostar. A não ser que seja plano seu desde o começo.

Ela não falou nada. Só respondeu com um sorriso carinhoso e maldoso. Sorriso de criança levada que ela tem. Bonito demais.
Deitou como uma perna em cima da minha. Cabeça no meu peito. O pé dela ficou na minha canela e ela roçou um pouco. Até a sola é macia.
A respiração dela batia no meu pescoço. Isso sempre me deixa maluco. Acho que já falei isso pra ela, até. Foi tudo premeditado, e eu gostei.

- Dá um calafrio quando você solta o ar quentinho.
- Incomoda?
- Não. Só dá um calafrio. É bom.

Ela subiu um pouco. Todo o corpo dela se arrastou pelo meu.
Abriu a boca e deixou o ar sair no meu pescoço. Eu até ouvi o barulho do vento no ouvido.
Minha cabeça levantou espontaneamente. Olhei pra madeira que fica na parte de cima da cama e logo fechei os olhos, quando ela beijou meu pescoço.
Perdi o controle.
Agarrei o corpo dela com força. Puxei pra cima de mim. Meus braços a envolveram pela costela, subindo até o pescoço. Ela colocou as mãos por baixo das minhas costas e subiu com elas até meus ombros. Beijou meu pescoço e esfregou a boca com a língua. Adoro aqueles lábios carnudos dela.
Foi até o meu ouvido e depois esfregou o rosto dela no meu. A pelo macia dela contra minha barba falhada por fazer. Tão macia...
Fiquei ainda mais extasiado.
Passou com a boca na minha, mas não ficou. Foi até o outro ouvido.
Desci minhas mãos pelas costas dela até a cintura e ela colocou a mão esquerda no meu rosto.
Levantou a cabeça e me olhou nos olhos. Pra minha cara de retardado. Sempre faço essa cara.
Sorriu, acho que gostou da minha cara. Na verdade aquele foi nosso primeiro beijo. E foi tão intenso. Foi bem do jeito que eu gosto. Lento, sem pressa nenhuma. Aproveitando cada instante. Ela mordeu meus lábios.
Eu não podia acreditar naquilo. Bem que eu sabia que mais cedo ou mais tarde aconteceria, mas ainda assim soava como um sonho.

- ô Silvana! Teu cachorro fugiu! – gritou a mãe dela

Chegou mais cedo em casa. Estragou nosso clima, mas tudo bem. Agora tudo mudou. Sim, agora nós somos um. Não estou com pressa. Foi só um momento, mas mudou a minha vida pra sempre. Pra melhor.

Uma maldição do passado



Nós nos encontramos no parque pela última vez. Pensei que ela nunca mais falaria comigo depois daquilo que fiz. Mas me chamou. Estranha, aquela sensação.
Noite passada eu nem acreditei no que eu fiz. Não era eu. Dormi por 16 horas e não queria levantar quando acordei. Eu queria acreditar que foi um sonho. Mas não foi, e tudo estava acabado.
Ela deixou recado com minha mãe no telefone. Queria me encontrar na praça lá em cima às dez. Perto da casa dela. Teve uma festa lá. Aniversário da mãe dela. Eu ainda tenho o convite.
Eram oito da noite. Passei o dia inteiro dormindo. Meu sonho estava bom, mas não consigo lembrar.
Eu me levantei e tomei um banho. Eu nem lembrava a última vez que eu tinha ido ao chuveiro. Tudo aquilo tirou meu foco das coisas. Como sempre, comecei a pensar no banho. Pensei na possibilidade de ela ter interpretado tudo como apenas um mal entendido. Ela confiava em mim, afinal. Como sempre, era eu inventando absurdos pro meu conforto.
Desliguei o chuveiro e tomei um banho frio. Foi bom, apesar de estarmos no inverno. Era o que eu queria.
Saí do quartinho dos fundos com a toalha. Foi até meu quarto e vesti qualquer coisa. Uma camisa de crente que sempre ficava em cima na gaveta como uma conspiração divina. Soldado de cristo. Hipocrisia do caralho eu usar aquilo.
Saí vagando pela rua. Estava deserta. Subi até a praça e a casa dela estava cheia. Carros estacionados por toda a parte, gente conversando na calçada. Gente sorrindo. Provavelmente não sabiam do que eu fiz.
Eu era um herói pra essas pessoas. Um salvador. Ir ali foi uma merda. Eu senti uma angustia horrível. Uma vontade de chorar, vomitar e se sair correndo. E também tinha medo.
Ela estava apoiada no muro de casa com o celular na mão. Estava rindo. Começou a escrever uma mensagem e nem viu que eu cheguei.
Deitei no banco da praça e olhei pro céu. Noite feia. Só nuvem no céu. Mesmo na parte escura você não via nenhuma estrela.
Meu celular tocou. Era o número dela, mas sem o nome. Eu nem estava lembrado de apagar da minha agenda.
Ela ouviu o toque e percebeu que eu estava escondido no escuro. Foi até lá. Ficou na parte clara. Irônico e verdadeiro, o contraste entre os ambientes.

- Como eu pude te amar? – perguntou ela
- Como pôde? – respondi.
- Porque você fez isso? – perguntou ela com voz de choro
- Não sei.
- Filho da puta, você tava planejando isso desde o começo.
- Não tava. Aconteceu.
- Quer dizer que um dia você simplesmente acordou querendo destruir a minha vida inteira? Aconteceu?
- É.
- Você é tão bom com as palavras. Pensei que pensaria em alguma coisa melhor pra dizer. Eu te deixei entrar na minha casa, seu merda. Você leu a porra do diário. Ninguém nunca leu aquilo além de você. Vai tomar no seu cú. Some da minha vida e não aparece mais. Nunca mais quero te ver. Você é podre e vazio. Vai morrer sozinho e infeliz.

Não falei nada. Deitei no banco novamente e olhei pro céu feio. Eu queria morrer.
Ela saiu. Foi em casa, mas depois voltou.

- Você não tem mais nada pra dizer? – disse ela
- Não. – respondi ao andar até ela.

Ela me deu um tapa na cara e cuspiu em mim. Ficou um tempo parada esperando eu dizer alguma coisa. Limpei o rosto e continuei em silêncio. Olhei pro chão e vi as sandálias dela. Ficavam bonitas nos pés pequenos que ela tinha. Eu que comprei, eram da moda e tudo. Me meti em cheque especial pra comprar. Disse pra ela que tinha sobrando, mas era mentira.
Pelo menos algo meu ela guardou.
Deu as costas pra mim. Entrou em casa e nunca mais a vi. Disseram que ela se mudou pra fazer faculdade fora.

Uma breve Crítica ao Projeto Vênus (e ao seu braço ativista: Zeitgeist)



Esse post foi retirado de um comentário meu feito na Wave de discussão do Movimento Zeitgeist. Se você quer ter acesso a esta, é só deixar seu e-mail na página de recados. tenho 17 convites disponíveis no momento e outros membros também os oferecem.

Meu ponto, ao qual não pude chegar por conta de uma falha no Wave, é que a idéia de Fresco é uma distorção e contradição no sentido social/psicológico.

Ele não fala nada sobre a possibilidade do desenvolvimento da personalidade. Pelo contrário, já ouvi da boca dele que tal coisa não existe e que o indivíduo é completamente fruto do seu meio, sendo o livre-arbítrio uma mentira.

Claro que a intenção é nobre, pois ele pretende tirar dos indivíduos a responsabilidade por seus atos e jogar a culpa na sociedade, aumentando assim a motivação para uma mudança.

Só que não se trata apenas de problemas técnicos. Essa pressuposição de que tudo no que concerne à organização social é técnico parece algo de alguém que estudou sociologia jogando sim city (o qual é programado e facilmente previsível).

Apesar das estatísticas, eu considero a vivência entre pessoas pobres mais amigável do que entre pessoas de classe media alta (nunca conheci um rico mesmo). Porque justamente na pobreza é que muitos começam a ter caridade. Quando você precisa, te ajudam, e vice-versa. Se não fosse assim muita gente poderia morrer de fome. Na classe média alta, pelo contrário, as pessoas vivem em conflitos superficiais. Isso é uma prova da minha vivência de que não é tão simples assim você atribuir à pobreza e ao instinto de sobrevivência os conflitos.

O ser humano jamais se submeterá ao tipo de automação que Fresco deseja. Ele diz que seremos livres, mas presume o behaviorismo, onde liberdade não existe lá no fundamento. Assim, ele só dará pão e circo ao povo, mas nossa existência consiste em muito mais do que isso.

Não só esse sistema jamais será capaz de acabar com os conflitos, já que eles não são motivados exclusivamente pelo sistema, como também causará a formação de rebeldes. Porque eles querem uma lavagem cerebral (desculpe o termo) porque querem uma mudança de valores e apresentam os valores deles como os ideais.

OK, alguns valores são interessantes e concordo com eles, mas principalmente na questão da religiosidade eles mandam muito mal. Com a visão behaviorista, a religiosidade não pode ser mais do um mecanismo de controle social.

Só não percebem que uma ideologia sociológica, tal como a que eles propagam, também é uma forma de controle social e de tentar passar valores universais.

Eles dizem que as coisas podem mudar, mas se mudarmos coisas fundamentais a própria idéia deles ficará meio desnaturada. Por exemplo, meu HD está lotado porque minha irmã guarda arquivos aqui. Eu passei a proibir esse estoque dela, argumentando que o computador é meu, o que é razoável. Isso é o conceito de posse: se eu estou sempre usando, é meu e só meu. Não o de propriedade, que me permitir ater dez computadores mesmo usando apenas um ou mesmo nenhum. O computador, bem como vários objetos provenientes da indústria, são personalizados e, portanto pessoais. Daí decorre que a idéia de posse é necessária, mas eles defendem que tudo seja compartilhado por todos. Obvio que adolescentes imaturos ou mesmo adultos podem fazem escândalos, dormir na casa dos outros e tudo mais. Muitas vezes, em conflitos, pessoas tomam certa propriedade por razões pessoais. Só para outra pessoa não poder ter.

Esses são pouquíssimos exemplos de como rebeldes destruiriam essa cidade rapidamente, pois jamais eles conseguirão doutrinar todo o mundo. Nem hoje em dia com a mídia Mainstream isso é possível!

O projeto Vênus precisa sim de leis. Precisa sim de um tipo especial de crédito. Minha sugestão seria um crédito que não pode ser usado em trocas entre pessoas. por exemplo, eu trabalho como professor universitário e fui avaliado como o melhor professor pelos alunos. Então eu recebo um adicional em créditos, com os quais posso obter mais recursos e melhorar minha conexão com a internet e outros serviços, como também simplesmente conseguir muita comida para fazer uma festa. Esses créditos serviriam apenas para conseguir coisas da fonte, como alimentos direto do plantio, etc. Assim, o crédito não poderia ser usado como fonte de riquezas, mas seria um limite para o acesso aos bens, porque eles nunca serão abundante so bastante para arcar com vândalos, que não vão desaparecer só porque têm uma casa bonita ao natural com tudo o que precisam.

Outro aspecto é a descentralização do poder, que é concentrado num computador. Quem já programou sabe muito bem que os parâmetros de uma máquina podem ser facilmente manipulados, e eu já vi inúmeros casos em que economistas se acusam mutuamente de explorar computadores para chegarem às conclusões que querem. Porque nas ciências sociais, você precisa usar uma premissa para construir um pensamento.

O computador do Fresco usaria a premissa comportamentalista para entender o ser humano, por exemplo, e nunca que o meio acadêmico aceitaria um absurdo desses. Não tem como colocar todas as decisões da sociedade para um computador. Não porque o próprio computador é mal, como Fresco diz que acham, mas simplesmente porque o computador não pode decidir com exatidão uma questão que não é exata. Para decisões técnicas é ótimo, mas para questões culturais será um fiasco.

Acho que o Projeto Vênus precisa ser revisto de forma profunda. Do ponto de vista técnico é perfeito. Tinha que ser: foi feito por um engenheiro. Mas do ponto de vista social, cultural e psicológico ele é um fiasco.

Nunca seremos




Agora digo isso com certeza
Nunca seremos um
É lamentável e libertador
Dolorido e estimulante

Porque eu dou
E você recebe
Nada mais
Nem peço nada

Se pedir, você foge

Você me convida para a sua casa
E me manda trazer o jantar
Se não temperei bem
Não me chama mais

Porque meu valor vem disso
Do sustento pro teu espírito
Mas isso acabou
Não me ajoelho mais

Você deixou claro
Que nunca seremos um
Que queria que eu fosse um membro
Como um braço

Bom quando é útil

Você não barganhou com a carne
Só deixou minha ilusão fluir
Eu me apaixonei pela sua máscara
Mas sua alma me desiludiu

Se você estivesse aqui
Diria o obvio
Não tem nada a dizer
Não se interessa

Decreto o fim
Não me procure mais
Não se confesse comigo
Não espere que eu te entenda

Ela falou


Quando ela disse as palavras mágicas eu fiquei meio tonto. A música tocando, carregou meu espírito. Algo tão belo, tão profundo. Meu mundo flutuou...

Uma demonstração prática das diferenças psicológicas



Postei em alguns lugares na internet uma questão que me ocorreu repentinamente. Sei que eu ouvi o Joseph Campbell falar algo parecido com isso, mas não lembro exatamente o que ele falou. Apesar de eu ter postado em cinco lugares diferentes, apenas dois receberam atenção: a comunidade do filme Zeitgeist, no Orkut (que recomendo) e a categoria religião e espiritualidade do Yahoo! Respostas. Vou citar as respostas das pessoas e fazer breves comentários para depois esboçar uma conclusão, unindo a informação ao conhecimento que tenho hoje. Nos casos em que eu estiver citando usuários do Orkut, usarei a sigla “OKT”, e pro Yahoo! Respostas, Y!R.

Notei que, quase como regra, as respostas das pessoas seguem padrões, que representam certos paradigmas. Alterei apenas coisas na formatação para pode encaixar melhor o conteúdo no espaço do blog. Por isso, algumas coisas podem ficar complicadas de entender, já que há internetês e incoerências. Mas acho valioso deixar a informação exatamente da forma que foi exposta.
Se você não teve a oportunidade de ver isso nos tópicos, aconselho a não ler o resto antes de comentar com uma resposta própria. Mas também não é o fim do mundo se você quiser ler o que os outros disseram antes de comentar.

A questão é a seguinte:

Imagine essa cena fictícia como se fosse real e tente responder à pergunta que a segue.


Certa vez, um homem foi condenado por seus crimes à uma prisão perpétua. Nessa prisão, que na verdade era um pequeno planeta, só existiam andróides. Esses robôs possuíam forma humana e simulavam o que ele quisesse. Assim, eles falavam apenas o que ele queria e faziam tudo o que ele mandava. Além disso, todos eram extremamente atraentes, cheirosos, carinhosos e dedicados a servir a todo o custo. Inclusive à satisfação sexual, pois havia robôs representando ambos os sexos.


Depois de um tempo preso no planeta, o homem se matou.


Por quê?

Vou colocar primeiro as respostas que se enquadram no que eu imaginei como padrão de resposta correta. O padrão eu vou deixar para o final.

Solidão. Ele não tinha outro semelhante com quem compartilhar as experiencias e dúvidas da vida. E um mundo que não apresenta resistência ou desafios só acentua isso. Quando voce encontra resistência, é sinal de que há outra alma ali, diferente da sua. E perceber isso é imprescindível.


"O buda em mim saúda o buda em você".


Em robos, não há buda algum.

Pensador Zen – OKT

A resposta desse usuário é uma das que mais se enquadram no meu padrão inicial de resposta. Ele deixa claro dois efeitos da solidão: Não há aprendizado em nível profundo, pois não existe outra pessoa que é diferente e que lhe oferece resistência. Além disso, não há conexão. O indivíduo não podia se sentir compreendido e acolhido de verdade. Assim, o contato humano é um fator crucial. O que ele chama de Buda, normalmente eu chamo de Daemon, em homenagem a Sócrates.

O que torna a vida interessante é sua imprevisibilidade...


Já li sobre um estudo feito com pessoas que ficam isoladas. Normalmente vemos os defeitos dos outros, quando não temos a quem olhar passamos a ver os nossos defeitos e a nos odiar. Mas tb estou com a cabeça muito cheia para pensar nisso agora...

Chaves Prowler – OKT

Essa foi uma resposta que, embora não se enquadrasse no meu padrão, o completou de forma interessante. Realmente, são os defeitos dos outros que vemos, ou mesmo os nosso defeitos nos outros. Mas assim que você toma consciência que não há nenhum outro e de que tudo é essencialmente você ( porque os robôs eram parte dele), então você tem que enfrentar a terrível sentença de conhecer tudo o que há de podre no íntimo. Para muitos isso é demasiadamente sufocante e deprimente. O bastante para inspirar um suicídio, talvez.

Eu acho que ele se matou porque viu a desgraça de viver na solidão.
e se deparou com a verdade:
Sua gingante insignificância.


Talvez o sentido da vida esteja escondido nas relações entre seres diferentes.


A incompletude de um completa o outro.


Um mundo de andróides não podia satisfazer este seu vazio, sua vida então se tornou sem sentido...
Ele percebeu que no fundo era tão vazio quanto estes andróides, e todas suas vontades eram pequenas demais frente às verdades do Universo.


Fazendo então com que desse um fim a essa sua vida "sem sentido".

Tevão - OKT

Uma resposta bem semelhante às anteriores. O que se acrescenta nessa é que ele citou o vazio decorrente da solidão da situação. A necessidade inalienável do ser humano de ter companhia.
Nesse caso, os robôs podiam simular grande parte das nossas atividades sociais, então o contato com o outro demandava profundidade. E isso as máquinas jamais poderiam oferecer.

Um robô não vive. Ele simula a vida, os sentimentos, e de forma bem primitiva. Ele só vê que os olhos robóticos conseguem processar (e, que eu saiba, o estado de espírito da pessoa não pode ser totalmente desvendado através de expressões faciais, batimentos cardiacos e outros sintomas físicos.)...não tem a mesma sensibilidade humana..duvido que qualquer tecnologia algum dia consiga armazenar as infinitas possibilidades, a complexidade do ser humano, principalmente psicológica. Só sendo Humano.


Na suposição, ele tem tudo o que quer, e não é feliz. Isso pode ser suficiente pra muitos hoje em dia. Para mim não é. Sempre escutei quando reclamava da falta de antenção da minha família ''você tem de tudo e ainda reclama''.

Eu tenho a necessidade de interagir com meus semelhantes (ainda não sei explicar porque) trocar idéias, tenho sonhos, tenho planos. Eu sofro com as pessoas que convivo, familiares, etc. Eles são vazios, sem opnião própria, sem objetivos importantes...sem sensibilidade. Só veem o que os olhos enxergam e nada mais...Parece que não vivem, não evoluem.

Talvez sejam essas necessidades que eu sinto(e outras mais) que esse homem também tinha, mas os robos desse planeta, incapazes de evoluir, não poderiam compreender.

É como eu me sinto, cercado de muitas pessoas..mas sempre sozinho.
Eu poderia definhar psicologicamente, e ninguém perceberia (acho q já acontece), e quando isso se tornasse visível fisicamente, poderia ser tarde demais.”

CosmO – OKT

Eu fiquei tocado com a sensibilidade dessa resposta. Se eu não estivesse organizando as resposta cronologicamente, provavelmente eu colocaria essa no topo. Não sou tão aberto assim em relação aos sentimentos ao ponto de reclamar que não recebo atenção, por exemplo. É mais natural pra mim ser agressivo, num postura defensiva onde eu afasto as pessoas. Apesar de o perfil apresentar o sexo masculino, há algo de feminino nessa resposta. E isso é bom, segundo a minha visão. Respondi a essa resposta:

Chegou ao ponto. Apesar de ser ficção, não é irreal.


Concordo contigo: só não acho que deve ser assim: existem pessoas com as quais podemos nos conectar. Que são pessoas, e não robôs. São raras, mas existem.

Solidão.


Talvez essa seja a melhor palavra que explique o ato.


E, não precisamos viver entre robôs para nos sentirmos sós, isso acontece em grande esacala.


Decobrimos que nosso crescente individualismo não nos trouxe paz interior, mas sim, nos trouoxe a solidão, a atomização, a dificuldade em relacionamentos, etc...


Por isso, entre outras tantas coisas, temos tantas pessoas "solitárias" entre a multidao.


O sentido da nossa própria existência se constrói junto com as pessoas que convivemos, com as pessoas que amamos.


É uma merda não ter ninguém pra desabafar, pra tomar uma cerveja na sexta depois do trabalho, pra dividir a pasta de dente, pra viajar, pra dar conselhos, pra sofrer junto, pra ver o sol se por, pra comer jujuba, pra receber presente surpresa, pra dar presente surpresa, pra deitar no colo, pra dar risada, pra chorar, etc...etc...etc...




Podemos ter todos os bens do mundo, como ele poderia ter, mas descobriríamos que ter todos esses bens não fariam o menor sentido se estivéssemos sozinhos no mundo.


O ato sexual com robôs, seria algo profundamente deprimente.


Na verdade, ele já é em muitas situações. Quando ele é movido apenas pelo prazer, sem uma relação de afeto e sentimento, ele se esgota na satisafação do prazer momentâneo, e trás à tona toda nossa "solidão", e insatisfação.


Há um termo que define isso que se chama: "tristeza pós-coito".


Agora imaginem ter apenas robôs como parceiros, seria realmente enlouquecedor...


A vida se tornaria insuportável, assim como se torna insuportável para tantos que cometem o suicídio por aí...


E, essa situação seria agravada pela falta de um ser humano se quer para se dividir as frustrações, angústias, medos, etc... Não haveria válvula de escape que não fosse satisfação momentânea de algum prazer material, que apenas pode distrair, nunca satisfazer.


Porque, ao que parece, o que nossa natureza exige é satisfação, e não distração.

Eduardo – OKT

Para mim essa foi a melhor resposta. Ela expôs de forma completa a minha idéia inicial e ainda conseguiu passar uma mensagem sentimental, coisa que poucas pessoas conseguem fazer em textos. Depois de ler as respostas, eu percebi novas e interessantes possibilidades, mas no começo, era exatamente essa a idéia que eu tive. Ele capturou e devolveu: sem necessidade de explicações complicadas, porque a questão foi bem simples. Temos muito em comum, ao que parece.

Os Andróides apesar de deter uma aparencia humanoide,não tem a capacidade de pensar como um. No caso o homem ficou louco em viver em um mundo onde todas as "pessoas" tem o mesmo pensamento,não existe questionamento,não existe perguntas.O condenado não poderia evoluir,não tem o que aprender.Todos em sua volta não tem nada para acrescentar para ele.
acredito q seja isso,ou algo parecido.

Henrique total90 – Y!R

Essa resposta foi muito parecida com a primeira exposta, do Pensador Zen. Ambas possuem formas diferentes, mas na linguagem do pensamento são assemelhadas de forma análoga: deixam claro que é necessário o contato com o diferente para evoluirmos, pois precisamos ser confrontados. Tenha isso o nome de evolução intelectual, psicológica, espiritual. No fundo, é a expansão da consciência recebendo nomes diferentes.

Não precisa ir tão longe para ficar sem RELACIONAMENTO meu caro essa é a essencia que faltou ao pobre HOMEM e isso explica tudo pois é simples lá ele se sentiu um HOMEM SEM AMOR pois tudo era feito atraves dele e para ele não tinha com quem partilhar dividir dar buscar e por ai vai.
E no nosso PLANETA foi nos dado TUDO sem simulação, deixou livre a PALAVRA e não é AUTORITÁRIO porque buscava e busca RELACIONAMENTO. Pois tenho a plena certeza se DEUS não tivesse a essencia de RELACIONAMENTO para com todos e tudo também morreria.

Salsicha – Y!R

Essa resposta ficou um pouco confusa, principalmente por causa das palavras com letra maiúscula e a pontuação precária, mas acredito que a mensagem é compreensível. Ele interpretou a questão espelhando-a na sua visão religiosa, o que era de se esperar, já que postei a pergunta na categoria de Religião e Espiritualidade. Não foi a primeira pessoa a associar a relação de Deus com o homem como análoga a isso: minha psicóloga também pensou assim. Porque Deus não suportaria viver com “robôs” ele criou o ser humano capaz de deliberar de forma relativamente autônoma. Deu a ele livre arbítrio, e assim pôde se conectar genuinamente com ele. Claro que isso é uma antropomorfização de Deus e não uma forma de argumentação teológica.

O que é a opinião, a instrução de um homem só? Nada mais é do que não é, ou seja, nada.


Ele já foi ao planeta com uma opinião formada do que tem-se como certo e errado, sem a opinião dos outros o que ele imagina que seja é. A realidade não passa de sua vontade, nada mais.


Então surge um confronto entre realidade e pensamento. O que ele pensa ser é, então o que ele nunca pensa jamais será? O que ele não decide não existe?


Sem o confronte de idéias ele não tem o que realmente, neste mundo, o seja. O que é real?


A realidade torna-se sua vontade, não tem-se o que realmente seja verdade, mas sim apenas sua opinião do que a seja.


Torna-se impossível de se viver em tal mundo, numa vida sem nenhuma possibilidade de reflexão do que seja verdade.


A morte é a única verdade absoluta, a única que se sobressai neste mundo, a única solução, a solução derradeira.

O mensageiro – Y!R

Apesar de eu concordar com tal reflexão filosófica, essa não era minha idéia original. Tal como a resposta do Chaves (segunda), essa deu uma significação mais ampla à questão. De fato, para quem, como eu, tem interesse em investigar o que é “verdadeiro”, a idéia de que isso não mais é possível tornaria a vida um terrível tormento. Claro que, no fundo, nós só acreditamos no que queremos, mas o contato com os outros muda nossas idéia, amplia nossas perspectivas e torna nossas posições mais profundas. Mas para isso acontecer, o contato deveria ser profundo, e os Andróides não poderiam fazer isso. Se ele os ordenasse que discordassem, deveria dizer a eles que argumentos eles usariam. Logo, nunca deixaria de ser um monólogo.


Apesar de ter toda a satisfação que uma pessoa desejasse, aquele homem percebia que os andróides só lhe faziam o que eram programados para fazer, não tomando assim, de forma alguma o status ou o lugar de humanos de verdade, que amam, odeiam, acariciam, brigam, etc.... Assim, se sentindo sozinho e vazio diante de tanta superficialidade, aquele homem preferiu dar cabo da própria vida, pois sabia que não poderia jamais ali encontrar outro ser humano de verdade .

Pimenta – Y!R

Nesse caso, há uma profunda analogia com a nossa sociedade e o drama do Outsider. Perceber que tudo é uma fraude nós mostra que estamos sozinhos e que tudo é vazio. Tudo é superficial e desprezível demais. Perceber que tudo é falso e artificial é terrível. E pior, perceber que essa estupidez é tudo o que há é desesperador.


Outro padrão de resposta também foi muito freqüente, embora eu não concorde com ele. É simplesmente baseado num paradigma que não aceito, mas não posso simplesmente ignorar por isso.

Tem uma história infantil que é mais ou menos assim, o rei que tudo tinha ou queria sei la. Pra resumir, o homem tem suas ambições, são elas que o conduzem e o estimulam para progredir na vida, uma vez cumpridas as ambições, a vida perde sua importancia e significado, então, novos objetivos são procurados. Uma pessoa que tem tudo e não precisa de mais nada é uma pessoa que não tem objetivos, logo, é uma pessoa sem razão para viver.

Breno Crispino - OKT

Quando se presume que nós somos apenas criaturas condicionadas por impulsos e pelo condicionamento da sociedade, tal pensamento é uma conseqüência fatal. Considero tal ciclo uma enorme futilidade. Na verdade, a ascese é uma boa demonstração de que o ser humano pode simplesmente negar tais coisas. Por mais que se diga que ela é condicionada socialmente, o que nos dias de hoje é absurdo, alguém um dia decidiu viver assim. Isso foi contradizer a sociedade e os impulsos. Foi deliberar. Acredito que o ser humano pode ir além de tais futilidades, mas essa crença eu não tenho como provar isso definitivamente: é um desejo, e não por isso deve ser falso.

Acho que a resposta está relacionada à pirâmide das necessidades de Maslow.


O homem vive para alcançar seus objetivos/necessidades, e assim alcançar a satisfação pessoal.


Sem objetivos para alcançar a vida não tem conquistas nem satisfação pessoal. Daí se deduz o restante.

Liane – OKT

Mais uma vez, o ciclo. O ser humano, aqui, não passa de uma maquina. Exatamente como um cão, que só faz tentar satisfazer suas necessidades ao simular comportamento amigáveis. É uma visão Freudiana do convívio social. Particularmente, prefiro a de Fromm, que se reflete nas primeiras respostas. É bem explicitada no livro “O Medo à Liberdade”.

Eros se extinguiu pela ausência do thanatus q o ressuscita, do inferno do outro.
.....
Será possível se matar no céu?

Ronis – Y!R

Esse usou até os termos que Freud usava. Mas tocou na questão religiosa e foi bem profundo. Primeiro, demonstrou que as adversidades são um estímulo que gera equilíbrio com os desejos. Eros e Thanatus. Depois acrescentou um comentário que a maioria não entenderia. Por que a idéia de paraíso é muito fútil. Se trata de Eros sem thanatus. Puro prazer sem nenhum tipo de mal. Sem a pulsão de morte. Na verdade, tal paraíso seria um ego perpetuamente inflado. É claramente a idealização de uma pessoa que não tem discernimento profundo sobre a existência. Digo isso porque o prazer sem a dor se torna tédio. Realmente, a dor se faz necessária, porque parece que na nossa cultura nós só nos dispomos a mudar quando diante dela. Não era essa a minha idéia, mas foi uma resposta excelente.
No entanto, segue aquele padrão de satisfação e desejo. Aquele ciclo que eu desprezo. Precisamente por isso que eu coloquei essa resposta com as últimas, por mais que ela sej aprofunda.


Tentei pensar em porque eu me mataria, ai vi que o que mais desencantaria é exatamente o "dolce far niente".
O ócio ,as vontades e desejos prontamente atendidos acabariam por levar-me a paralisia ,a falta de estimulo e consequente depressão.


Desafios em diferentes níveis são o que torna a vida digna de ser vivida.
Acho que este paraíso de abundÂncia, satisfação infinita e nada a fazer seria meio caminho andado para a morte física e mental.

Lirio – Y!R

Mesmo padrão do ciclo. Bem característico da nossa sociedade capitalista, que propaga essa forma de pensamento: que o ser humano precisa estar sempre sendo desafiado e sempre fazendo conquistas. O paradigma do agir sempre, que torna a nossa sociedade produtiva: a nossa fábrica de workaholics. A conquista sempre tem que ser externa e material. Não nos mandam conquistar um amigo, ou conquistarmos a nós mesmos.

Algumas respostas saíram fora desses padrões, mas não por isso deixam de ser interessantes:

A mais ou menos um ano e meio eu moro sozinho e só fico absolutamente tranquilo quando estou sozinho.


Os únicos aborrecimentos que tenho são: ou quando estou no trabalho, cercado de gente ou quando estou pensando nessa gente junto ao trabalho.


Logo: acho que adoraria receber essa pena de ir morar nesse planeta, sem nenhum pentelho para me encher o saco.

EwErToN – OKT

O indivíduo parece não demonstra qualquer necessidade de expandir a mente através dos outros e também não parece se importar com o contato com o próximo. Na verdade, as relações que ele tem  parecem ser bem superficiais. Então a compreensão de relação que ele tem não pode ser profunda. Se não há a compreensão de um tipo profundo de relação, então realmente esse planeta é um paraíso. Sem aborrecimento e cheio de prazeres carnais. Na verdade, creio que a essa resposta faltou profundidade.

Trabalho, aflição, esforço e necessidade constituem durante toda a vida a sorte da maioria das pessoas. Porém se todos os desejos, apenas originados, já estivessem resolvidos, o que preencheria então a vida humana, com o que se gastaria o tempo? Que se transfira o homem a um país utópico, em que tudo crescesse sem ser plantado, as pombas revoassem já assadas, e cada um encontrasse logo e sem dificuldade sua bem-amada. Ali em parte os homens morrerão de tédio ou se enforcarão, em parte promoverão guerras, massacres e assassinatos, para assim se proporcionar mais sofrimento do que o posto pela natureza. Portanto, para uma tal espécie, como a humana,nenhum outro palco se presta, nenhuma outra existência.
(Parerga e Paralipomena, cap XII, § 152)

Duan – Blogger

É principalmente focado nas circunstancias externas, tal como estava a própria pergunta. No entanto, não é só para a existência física que tal coisa se aplica. Na verdade, nós sempre precisamos desse thanatus, dessa pulsão de morte. Como Schopenhauer apontou, sem esse thanatus na natureza o homem criaria um por conta própria, porque está em sua natureza a necessidade por conflitos. Pessoalmente, imagino que esses conflitos não precisariam ser necessariamente físicos. Mas, obviamente, para algumas pessoas (que são diferentes de mim), ele se tornaria fatalmente físico. Uma pessoa que vive sem adversidades íntimas e externas simplesmente não se move para lugar algum. A dor é um grande motor para o nossa existência, e o próprio Nietzsche apóia tal posição.

Duas pessoas se arriscaram a dizer que o fim foi arbitrário e que poderia muito bem ser outro:

“Não é real, no final que inventou podia muito bem botar: "Então ele virou um dinossauro e.... ou então ele criou chifres e ...." isso não é muito questionnvel!”

Stefersson – OKT

“É uma conclusão tão definitiva assim de que o cara vai se matar?
Será q não existe outra possbilidade?

A filosofia me diz que sim...”

Fernando – OKT

Tal questionamento é basicamente uma fuga do assunto. Não perguntei se a pessoa achava provável que o indivíduo se mataria. Estava no passado: ele já tinha se matado. Não se tratava de uma pergunta com uma resposta pronta e absoluta, mas muito mais de uma pesquisa de opiniões. O que eu queria é que as pessoas imaginassem a situação e se colocassem no lugar do sujeito. Que pensassem: porque eu me mataria?
A maioria conseguiu responder a essa pergunta, mesmo com opiniões diferentes da minha. Dizer que o final poderia ser outro ou, de forma mais direta, que o final foi simplesmente inventado é como imaginar que o indivíduo na verdade não teria realmente um motivo para cometer o suicídio. Noutras palavras seria imaginar que a situação poderia muito bem ser satisfatória.
No meu convívio social, de forma deprimente, eu fui levado a crer que isso não é falso. Perguntei isso a pessoas próximas, que obviamente não vou identificar, e fiquei perplexo com o padrão de respostas. Disseram que não há motivo algum para se matar nesse mundo. Aliás, há uma resposta análoga a essa na comunidade Filosofia (que não recomendo). O indivíduo disse que o personagem se matou porque é um idiota.

Nessas respostas pode-se ver dois padrões que parecem ter algum fundamento psicológico. Funcionam com lógicas bem diferentes, mas não consigo deixar de vê-los como complementares. Particularmente, eu não vejo nenhum sentido nos desafios como as pessoas os entendem. Pra mim, lutar por uma promoção, para ter uma casa maior, ou qualquer tipo de conquista externa é uma enorme perda de tempo. Mas se todas as pessoas fossem assim, provavelmente nossa tecnologia não poderia estar como ela é hoje. Seríamos ainda monges vivendo em meditação e iluminação íntima. É natural para mim presumir que o que matou o indivíduo foi a solidão, já que ele não tinha contato real com ninguém. Na verdade, essa era uma ilustração da nossa própria sociedade, que é tão presa a convenções e formalidades que pode colocar dez pessoas juntas numa sala e ainda manter todas elas totalmente solitárias. Pro mundo externo, as pessoas mostram um comportamento robótico, por vezes completamente alheio ao que elas são. Precisamente por isso, na internet os fakes são muito freqüentes: porque com eles os indivíduos podem exibir tudo aquilo que é proibido à sua posição social.
Por outro lado, há desafios que as nossas relações com os outros criam. Geralmente, o maior desafio é conseguir efetivamente entender outras pessoas. Para isso, devemos abrir mão do que somos. Entender a pessoa pelo que ela é, que é diferente do que tentar se imaginar no lugar dela, como se ela tivesse a obrigação de ser como nós somos. Nessa caso, não se trata propriamente de um desafio externo, mas de um interno. E também não é apenas a boa sensação que temos quando estamos conectados: é expandir a consciência. E isso é um enorme desafio. Concordo que, sem desafios, o ser humano mergulharia num enorme tédio. Mesmo estando conectado com um amigo profundamente, se osdois estiverem parados e sem nenhuma perspectiva, não terão nem como dar continuidade a essa conexão. Afinal, isso envolveria compartilhar coisas, e não teriam nada a compartilhar.
Vejam que me refiro à coisas completamente abstratas aqui, que diferem totalmente de bens práticos. Tenho grande dificuldade em valorizar coisas físicas. Parecem indignas. Talvez por causa da minha criação no meio cristão ou do meu tipo psicológico.
É interessante, também ressaltar a questão do thanatus, que foi levantada pelo Ronis e expandida pela citação de Schopenhauer feita pelo Duan.
Não se trata de um desafio amistoso, como entender outra pessoa ou construir alguma coisa útil à todos. É, pelo contrário, sofrimento intenso. Basicamente, era pra poder caçar e fugir que o homem antigo aprendia a correr. Por isso que é mais fácil encontrarmos muitos corredores numa tribo a savana do que na nossa sociedade: não precisamos mais correr por nossas vidas como antes. Não em todos os lugares. Afinal, por mais que o indivíduo seja rápido, ele não vai fugir de balas perdidas.
Mas nós comemos porque somos atormentados pela fome, bebemos por causa do tormento da sede. Trabalhamos por causa do medo de sermos excluídos da sociedade, estudamos, de um modo geral, para podermos sobreviver na sociedade. Ou seja, é por medo do sofrimento. Dificilmente algo diferente da dor motivaria as pessoas.

Lembro da época do segundo grau, em que uma menina decidiu se aproximar de mim. Naquela época eu era muito hostil.
Ela afirmava que eu era o único garoto consciente ali, que se preocupava com o futuro. Que eu lia porque eu sabia que aquilo seria útil pra minha vida, pra eu ter um bom emprego. Geralmente eu a respondia com monossílabos, mas uma vez eu dei uma resposta direta:

“Você acha que eu estou lendo aqui pra me preparar e ser um bom escravo? Não me importa nem um pouco ter um bom futuro. Eu não me envolvo com as pessoas daqui porque elas são idiotas. Eu estou lendo esse livro porque eu acho que ele vai expandir a minha mente e meus conhecimentos. Eu aprendo porque eu gosto e não porque no futuro isso vai me beneficiar financeiramente. Por favor, você acha que ler Schopenhauer ou Goethe vai me fazer ter um salário melhor? Tudo isso aqui é uma merda e essas matérias que nos obrigam a decorar são questionáveis(falava do colégio).”

A única coisa que ela entendeu da minha resposta foi o tom de voz, que a deixou chateada. Depois desse dia, ela passou a me detestar. Não a culpo.
Imagino que tenha sido impossível pra ela entender o fato de que eu estava lendo simplesmente por ler. Na verdade, não era bem isso. Eu estava lendo os aforismos para sabedoria de vida, de Schopenhauer. Estava gostando daquela visão. Eu só estava ampliando meu desprezo pelo mundo. Estava realizando meu desejo. Não era nada externo, mas era um desejo, de qualquer maneira. Na verdade, também era uma fuga da dor, e portanto, toda a leitura e reflexão ali envolvidas eram motivadas basicamente pela minha necessidade de fugir da dor que meu isolamento social me causava.
De forma resumida, eu li livros e passei horas refletindo pelo simples fato de que eu estava sofrendo. Sem tal sofrimento, eu nunca teria assimilado aquelas lições, que até hoje considero valiosas, embora as veja de forma diferente.
Acredito que ele pode ter se matado por um dos motivos, dependendo de como ele era. No entanto, eles podem coexistir separadamente. Não como se fossem um motivo só, mas duas fontes diferentes de sofrimento: solidão e tédio. E o tédio existe sem solidão, e vice-versa. É porque sofremos com a solidão que queremos conexão em primeiro lugar, da mesma maneira que sofremos com o tédio. Para unir, talvez seja interessante colocar o sofrimento como força motora.
Não sei dizer por qual dos motivos eu me mataria, mas sei dizer que me mataria.



Meu irmão e eu no reino das trevas


Eu estava no inferno novamente. Dessa vez eu cheguei até a mesa onde Mefistófeles e o velho estavam me esperando. O velho estava tenso e eu sentia que possuía uma mensagem em mim para ele. Não sabia muito bem que mensagem, mas tinha que deixar fluir das profundezas do meu ser.

-    Porque, irmão? Porque você me abandona? – perguntou o velho.
-    Não te abandono. Você está enganado.
-    Você está me deixando sozinho. Você fez um pacto de que não me deixaria sozinho aqui!
-    Irmão. Você deixa a si mesmo sozinho. O tempo de aprendermos sobre a destruição acabou. Precisamos agora continuar nosso caminho. Precisamos deixar a corrente nos levar para novas possibilidades.
-    Eles te contaminaram. Você devia ter impedido isso.
-    Não. Não devia.
-    Eu não posso continuar sem você. Será que não entende? Nós representamos o equilíbrio do universo!
-    Você está perdendo o contato com sua essência, irmão. Não percebe? Mefistófeles não é você. Não é a sua função manter o equilíbrio. – eu falei sem muita consciência do que isso queria dizer.

Mefistófeles me jogou a carta e eu peguei com a mão direita. Quando a passei pra esquerda ela desapareceu. O anel a destruiu.

-    Viu? Em breve esse anel terá te profanado tão profundamente que você já poderá voltar ao inferno. Eles te querem como um escravo, você sabe disso.
-    Não. Sou eu, irmão. A minha essência mudou nesses milênios. Eu já não sou aquela criatura destruidora que fez o pacto de servir a desintegração. Nem você.
-    Você está perdendo o juízo. A energia deles está tomando conta do seu ser.
-    Não. A totalidade está tomando conta do meu ser.

Eu levantei minha mão direita e mostrei a ele. Minha pele começou a envolver o anel de Mefistófeles. Ele se acoplou de tal maneira em mim que nos tornamos um.

-    Você é um só. Como pode ter essas forças dentro de si? Como pode ter todo o universo na sua alma e sua alma em todos universo? Como!?
-    Eu parei de perguntar como e deixei o meu corpo flutuando no cosmo. Aí os fluidos da natureza, os que caminha para a totalidade, me mostraram o caminho. Não é um caminho a ser controlado e entendido, mas a ser sentido e vivido. É o caminho para o infinito.
-    Então era esse o convite. – disse o velho ao jogar as cartas na mesa.

Mefistófeles não falava sequer uma palavra. Ele não é um ser humano, mas uma força do universo. Não pode deliberar. Ele só é.

-    Você também o recebeu, irmão. Junte-se a mim. – disse eu com esperança.
-    Não posso. A minha alma e Mefistófeles estão fundidos. Eu fiz isso para que você pudesse ser livre.

A mesa voou e eu vi a perna direita dele. A partir do joelho ela deixava de ser a perna dele e passava a ser a de Mefistófeles. Os dois permaneciam na mesa daquela maneira porque suas pernas estavam presas como que cirurgicamente. Por causa daquilo ele só poderia trilhar o caminho do diabo. Uma voz rouca, a minha voz, gritou perguntando quem eu era. Eu perguntando a mim mesmo como se eu fosse outra pessoa.

-    Meu tempo está acabando. Irmão, Encontrarei gaia. A encontrarei e você será livre. Eu prometo.

O velho me olhou com um olhar de quem não gosta da idéia, mas que ao mesmo tempo parece aceitá-la. Fui puxado para fora do inferno e o portão se fechou. Não seria pelo portão do tártaro mais o meu caminho. Tantas vezes o trilhei, mas isso tudo ficou no passado. Agora era a hora de buscar as respostas. De encontrar Gaia. Mas o mundo balançou e eu fui convocado à realidade.

Sobre Materialismo e Hedonismo como o fundamento da desordem social


Já falei nesse blog sobre uma natureza ontológica e universal do mal enquanto força destruidora. Nesse caso, o mal seria como uma reação catabólica e o bem como uma reação anabólica. Destruição e construção cooperando para o inacabável processo de modificação de todas as coisas. Não pretendo me aprofundar em tais afirmações agora, mas que fique claro que esse paradigma não justifica ou torna legítimo o ato destrutivo sendo praticado por seres conscientes: O próprio mal em sua manifestação pura na consciência existe em contraposição ao bem e não para se afirmar como absoluto. Sem o mal, sem a dor, o homem não se move. Porque o prazer não busca sua causa, mas a dor sim. Assim falou Nietzsche.
Mas o mal que aqui coloco em pauta nada mais é do que decorrência da ignorância do que de uma fonte metafísica. É um mal que afeta tanto os valores sentimentais quanto os paradigmas racionais e que causam severos estragos em ambos. Apesar de abordar os dois, pretendo dar ênfase num deles: O Hedonismo, que é conseqüência sentimental do materialismo.
Considero ao menos ingênua a afirmação de que as premissas científicas são objetivas e de que suas conclusões deveriam nos levar apenas a proposições racionais, das quais a subjetividade e os sentimentos deveriam estar separados.
Não só o paradigma científico traz conseqüências limitadores no que se refere à compreensão da consciência, como ele traz severas implicações sentimentais na formação dos valores da sociedade.
Não quero, com isso, defender a moral de alguma religião ou algum ponto de vista religioso, mas é obvio que os homens formam seus valores segundo critérios racionais, e os critérios materialistas só levam quem acredita neles ao Hedonismo.
Afinal, ao presumirmos que tudo é matéria e que nossa consciência nada mais é do que uma conseqüência acausal no meio do caos atômico, o valor da própria consciência se diminui drasticamente. Na verdade, essa visão simplesmente esvazia o ser humano de qualquer senso profundo de conexão, e isso já causa um enorme sentimento de perda e vazio. Aliado a isso, o homem vê diante de si premissas que afirmam que a vida é assim. Que realmente não possui nenhum sentido ou finalidade. Os paradigmas científicos atuais (os do mainstream, para não ser injusto) só oferecem alternativas para o bem estar do indivíduo se essas estiverem dentro do seu espectro de compreensão. Daí decorre que, se presumem que a consciência é apenas um resultado do acaso na matéria e que a matéria representa a realidade ontológica, somente serão aceitas as propostas para o bem estar que surgirem fundamentadas na matéria.
Chegam, aliás, a afirmar de maneira mesmo desonesta que todos os tipos de prazer que não decorrem de algum efeito materialmente comprovado são “só psicológicos”. O juízo de valor implícito é que o que é psicológico não é propriamente material, e assim, é ilusório. Interpretar o efeito placebo segundo essas premissas é irônico, pois assim se presumiria que o homem se cura simplesmente porque é enganado.
Ao negar a consciência universal (não confundir com a idéia de Deus) e, conseqüentemente, negar que há conexão profunda entre todas as coisas, o indivíduo passa a buscar fora de si as respostas que ele deveria encontrar dentro. E pensa encontrar alguma coisa quando os nossos cientistas (xamãs) os mostram com suas mirabolantes racionalizações que tudo o que eles precisam e praticar esportes, tomar esse ou aquele remédio, fazer mais sexo ou qualquer outra coisa que seja essencialmente material e externa, porque o universo imaterial e interno (falo no singular porque estão conectados de forma tão profunda que os vejo como um) não se adéquam ao paradigma materialista.
Daí decorre que o ser humano começa a buscar compulsivamente fora de si o que está faltando através desse hedonismo, e que percebe que não basta. Mas não deixa seu paradigma por isso. Apenas presume que precisa de satisfação mais intensa desses impulsos para que seja feliz. É mais ou menos assim que acontecem com as drogas: o viciado usa cada vez mais em busca da felicidade. No final, ele está destruindo tudo o que ama, se afastando das pessoas e se autodestruindo.
O paradigma hedonista materialista não dá margem à conexão profunda entre os indivíduos, mas apenas à conveniências. Noutras palavras, a conexão que um homem tem com uma mulher não passa de uma troca de favores sexuais, e no momento em que um dos dois descobrir outra pessoa que o traga mais satisfação sexual, a anterior deve ser simplesmente abandonada, porque a outra trará mais felicidade.
Ignoram todos os aspectos imateriais (que são, em essência, consciência ou, no caso dos que acreditam nesses paradigmas, inconsciência) na relação e a reduzem ao ridículo só para manter um paradigma ultrapassado.
Podem dizer que é o dinheiro que causa a maior prisão na vida dos homens, e que num mundo sem dinheiro as coisas seriam muito melhores. Mas a verdade é que o homem só deixará de ser um animal compulsivo e infantil quando sua consciência se elevar acima dessas coisas. Existe a possibilidade de, num mundo com dinheiro, o indivíduo se encontrar liberto desse hedonismo de tal maneira que nem todo o dinheiro do mundo parecerá ter algum valor. O maior problema das pessoas não se encontra fora, mas dentro delas. Porque é o que está dentro da maioria das pessoas é que constrói o fundamento sobre o qual toda a desordem social se firma.
Afinal, o que é lucro senão uma busca desenfreada por bens materiais que prometem a felicidade? Se o homem busca alguma coisa, é porque essa está em falta. Mas se os homens mais ricos e poderosos do mundo continuam buscando riquezas e poder, não é porque isso deveria estar em falta?
Enquanto o paradigma materialista reinar e fundamentar o hedonismo, a despeito de que ambos são injustificáveis, o mundo não melhorará. Pelo contrário, tal forma de tratar a existência traz destruição e auto-destruição.

O rosto da Deusa


Ele me deixa encantado
Entorpecido, perplexo
É belo e divino
Malicioso e poderoso

Ela tem lindos dentes alinhados
Caninos afiados, lábios convidativos

Tem cabelos longos e lisos
Com folhas que se envolvem entre os fios
Tudo nela é original
A lua vive na testa dela

Seus olhos não só recebem luz
Eles também a emitem
Ela auxilia-me na escuridão
Não sou totalmente cego

Graças ao rosto da deusa

Breves considerações sobre epistemologia e comunicação.


Pretendo, com esse texto, dar uma introdução a um tema extremamente amplo: a construção e o funcionamento de paradigmas racionais e sistemas de valor. Apesar de separar os termos para melhor me expressar, saliento que, na linguagem do pensamento, não existe tal separação: paradigmas influenciam valores e vice-versa.

O conhecimento transcende a informação, porque ele vai para além de só memorizar dados: ele é o resultado de julgamentos racionais e sentimentais acerca de determinada informação. A informação, por outro lado é algo destituído de juízos por si mesmo.
Para desenvolver o raciocínio, vou separar (por didática) dois tipos de pessoa: aquelas que absorvem informação e aquelas que absorvem conhecimento do mundo externo. Claro que não existe uma pessoa que se fixe apenas num pólo, pois isso é completamente impossível na prática em ambos os casos.

Alguns indivíduos, ao absorverem um conhecimento, absorvem também o juízo de valores e das premissas racionais de quem transmite tal conhecimento. Exemplos variam de propaganda à pregações religiosas. Quando um religioso ouve e acata o conhecimento transmitido por seu líder ele passa a se encaixar naquele modelo de pessoa que absorve conhecimento do mundo externo: seus paradigmas e valores vêm de fora e isso caracteriza extroversão. No entanto, como salientei no primeiro parágrafo, não há como ser totalmente passivo o tempo inteiro: se o mesmo líder decidir se opor a tudo o que explicitou até o momento é provável que o mesmo religioso se negue a aceitar a mudança, alegando que o líder perdeu o juízo ou está, de alguma forma, possuído (fora de si).

Outros indivíduos absorvem apenas informação, buscando filtrar os juízos e as premissas usados pelo autor para “purificar” a informação. Isso pode, com efeito, distorcer o pensamento alheio ao adaptá-lo aos próprios paradigmas. Apesar disso, por mais que esse tipo de indivíduo queira se libertar dos juízos do outro, todos os seus julgamentos são fruto dessa informação que ele absorve do mundo externo.

Entre os dois tipos descritos eu poderia criar uma enorme quantidade de sub-variáveis, mas não é minha intenção com esse texto criar uma tipologia psicológica (se fosse eu estaria sendo irresponsável).

Na verdade esse texto não é revolucionário nem para o mundo externo da produção de conhecimento científico e tampouco ao meu blog. Já discuti sobre epistemologia e em diversos posts desse blog. Nada mais escrevo aqui do que a forma de comunicação intelectual que considero mais eficiente.

De início cito uma lembrança de um vídeo que me trouxe algumas reflexões racionais e éticas. Um pálido ponto azul (the pale blue dot) que, se não me engano, é baseado num texto de Carl Sagan.

Falando superficialmente, o que o texto disse foi o seguinte: isso que vemos como imensidão e chamamos de mundo não passa de um pálido ponto azul no meio do universo imenso. Noutras palavras, o texto quis dizer que o nosso mundo não significa nada e que, conseqüentemente, nós também não significamos nada diante da imensidão do universo. Uma mensagem que salienta a necessidade de humildade.

Eu, ao entrar em contato com a informação acerca da dimensão do mundo, pelo contrário, não pensei que não somos nada, mas que somos tudo. Noutras palavras, do ponto de vista ontológico, eu vejo todas as coisas como sendo inseparavelmente conectadas ao ponto de poder dizer que nós somos o universo e vice-versa.

E no final, por mais que tenhamos feito uma viagem de raciocínio diferente, chegamos à conclusões parecidas. Afinal, se todos são um, apenas um indivíduo não pode se considerar como algo à parte (melhor), especial, digno de mais. E a conclusão de Sagan foi parecida: tudo aquilo a que damos valor não é assim tão especial. No final das contas, cada um de nós à sua maneira, estávamos julgando e condenando idealismos e atrocidades cometidas pelo ser humano em nome de algo “especial”.

Nossos pensamentos percorreram caminhos diferentes por causa de uma pequena premissa: ele presumiu que o pálido ponto azul (isso ficou implícito em julgar sua insignificância) é separado do resto do universo e eu que esse ponto é o universo. Noutras palavras, eu vejo tudo como um e ele como uma grande multiplicidade de diferentes e separados fatores.
É claro que as visões, ao menos do meu ponto de vista, são de caráter pessoal: ele olha e ver diversos organismos, eu olho e vejo um só.

Se ele não tivesse emitido seus juízos eu jamais teria pensado a mesma coisa que ele. A pura informação me levaria a conclusões totalmente diferentes, a despeito do fato de que ele acredita que qualquer um que veja tal coisa deva chegar à mesma conclusão que ele.

Daí decorre que nem sempre a mensagem (que existe em forma de pensamento) é traduzida perfeitamente para o agente passivo do processo de comunicação.

Por isso que saliento a importância da exploração de todas as premissas utilizadas na construção de um pensamento bem como a forma através da qual se construirá o conhecimento tendo por base tais premissas (porque uma premissa pode levar a diferentes conclusões). É sempre interessante criar esse itinerário para a expressão do pensamento porque isso facilitará a compreensão (trazendo críticas mais fundamentais e produtivas) como também eliminará a possibilidade de o pensamento ser interpretado como algo imperativo: afinal, assim o leitor tem a possibilidade de questionar fácil e claramente o fundamento do pensamento estando certo de que não está cometendo algum equívoco interpretativo (assim, se torna positivo para ambos os tipos que eu defini). Além disso, dessa maneira uma pessoa que se guia por premissas diferentes e por uma epistemologia diversa pode absorver a informação como o ponto de vista do autor ao invés de simplesmente discordar e não absorver por considerar um mero erro.

Se tal “exploração” das premissas e do método epistemológico não for feita detalhadamente, provavelmente aqueles que não acreditam nas premissas do autor vão começar a discordar do texto no começo e desconstruirão o conhecimento ao invés de agregá-lo e construí-lo.

Depois que tal conflito se inicia com a desconstrução, fica difícil dizer quem distorce o discurso de quem: o autor pode estar distorcendo a crítica e o crítico distorcendo o discurso do autor. Se inicia um “duélogo”.

Um ponto importante e salientado em outros posts é que seja exposto, sem piedade, o caráter metafísico inerente da metafísica escolhida. Do ponto de vista absoluto, sempre há algo no nosso pensamento que é injustificável(de origem psicológica pessoal). Por maior que seja nossa rigidez, o conhecimento é um fluido. Isso se aplica especialmente quando estudamos o ser humano com sua plasticidade. Afinal, não se pode definir um pensamento completamente.

O paradigma ao qual eu fiz alusão sobre a inseparabilidade é um juízo de valor sentimental e traz diversas influências sobre meu pensamento: Ele torna inacetiável o sistema de disputas do capitalismo, já que, segundo tal ponto de partida, eu estaria entrando em conflito comigo mesmo ao conflitar com o outro. Daí decorre que uma visão poilitico-social adequada a esse ponto de partida seria aquela em que ninguém está acima de ninguém (na prática) e que todos cooperam voluntariamente pelo bem coletivo (porque o coletivo coopera para o individual).

No entanto, seria irresponsabilidade substituir o paradigma mecanicista (divisibilidade, simplicidade e estabilidade) por esse de modo absoluto. Isso porque o paradigma citado possui implicações práticas que saltam aos olhos. Por mais que eu acredite que a matéria é, em essência, feita de não-matéria, não há como lidarmos com ela, na prática, partindo de tal premissa (não no presente momento). E esse é um forte argumento sobre a validade do paradigma antigo. Só não é possível, com esse, explicar algo relativo ao convívio humano, porque as premissas simplificadoras simplesmente não dão conta da plasticidade de um pensamento (que não é matéria e nem energia).

Creio que tal forma de expor um pensamento o torne mais inteligível e ordenado, sendo essa uma forma aceitável de expormos nosso pensamento através dessa linguagem deficiente.