Esses versinhos sobre o amor podem até soar agradáveis. Mas infelizmente, com a minha experiência, acabei concluindo que não é bem assim que as coisas funcionam. Parece uma demonstração de paixão daquelas que qualquer um acreditaria ser durável, eterna. Eu mesmo acreditaria, porque a idéia me agrada profundamente.
Mas encarando os fatos eu acabei notando algo um tanto desconcertante acerca das paixões e amores: vêm com um intuito, para serem realizados. Quando se realizam, e aprendemos as lições íntimas necessárias, eles desaparecem no ar. Nos esforçamos inutilmente por resgatar o sentimento de paixão desaparecido. Inutilmente porque a paixão se realizou e avançamos adiante no crescimento psicológico.
Todo aquele apego se vai, e o relacionamento esfria, simplesmente porque um dos dois ou ambos desvendaram a paixão.
“em 1º de janeiro de 1896, Freud, O analisando, escreve a Fliess, o analista, uma carta de “agradecimento”. Assim, agradecer a alguém é às vezes convida-lo a retirar-se.”
Quando isso acontece, a atração se acaba de forma pacífica. Como se o desapego fosse realmente uma conseqüência do crescimento. Todo aquele amor se dissipa e perde o sentido e a direção: acabamos direcionando mais amor para o universo.
Amores podem acabar de forma violenta ou pacífica. Podem fazer a pessoa crescer ou não. Mas há uma coisa certa: ele sempre faz com que a pessoa se desenvolva. Por isso é essencial.
Não é só a pessoa que nos apegamos. Também nos apegamos a idéias, crenças e sentimentos. Na base desses se vê a metafísica, que tem causa psicológica. Assim, nossas idéias, crenças e sentimentos surgem com base na nossa identidade psicológica.
A mutação desses é decorrente da mutação da nossa essência, que muda o fundamento metafísico que nos guia.
Um grande erro que cometem com freqüência é a prisão num desses estágios. Prender-se a uma pessoa, uma idéia, uma crença ou um sentimento. Porque essa prisão impede o desenvolvimento pleno das faculdades de amor e liberdade. Os apegos são prisões...
Há uma fase em que os apegos vão embora de forma pacífica. O que sobra é o agradecimento. Agradecemos pela forma com que esse ou aquele apego nos auxiliou no desenvolvimento, mas desapegamos. O objeto ao qual estávamos apegados se torna parte do todo que amamos.
Nesse ponto o amor é livre, porque não está acorrentado a uma idéia, uma crença, um sentimento ou uma pessoa. Não se prende a nada. Amor livre.
Depois disso o que sobra é a paz de espírito. Um contato com a espiritualidade que jamais poderia ser verdadeiramente experimentado enquanto existisse apego.
Desapego nos permite amar de verdade e ser verdadeiramente livres. É o caminho real para a plenitude!
Mas não há como forçar. Pelo contrário, quando uma pessoa se nega a viver suas paixões e seus apegos ela não encontra essa paz. Pelo contrário, vive a vida inteira lutando contra o desejo que nunca vencerá. Viver, tanto em imaginação quanto em realidade, nossas paixões é essencial para assimilarmos nossas lições de existência.
Deixo aqui as sábias palavras de Kahlil Gibran sobre o amor.
“Quando o amor vier ter convosco, continuai seguros embora os seus caminhos sejam árduos e sinuosos. E quando as suas asas vos envolverem, abraçai-o, embora a espada oculta sob as asas vos possa ferir. E quando ele falar convosco, acreditai, embora a sua voz possa abalar os vossos sonhos como o vento do norte devasta o jardim.
Pois o amor, coroando-vos, também vos sacrificará. Assim como é para o vosso crescimento também é para a vossa decadência.
Mesmo que ele suba até vós e acaricie os mais ternos ramos que tremem ao sol, Também até às raízes ele descerá e abaná-las-à enquanto elas se agarram à terra. Como molhos de trigo ele vos junta a si. Para amanha vos pôr a nu.
Vos peneira para vos libertar das impurezas. Vos mói até à alvura. Vos amassa até vos tomardes moldáveis. E depois entrega-vos ao seu fogo sagrado, para que vos tomeis pão sagrado para a sagrada festa de Deus.
Toda estas coisas vos fará o amor até que conheçais os segredos do vosso coração, e, com esse conhecimento, vos tomeis um fragmento do coração da Vida.
Mas se, receosos, procurardes só a paz do amor e o prazer do amor, então é melhor que oculteis a vossa nudez e saiais do amor, para o mundo sem sentido onde rireis, mas não com todo o vosso riso, e chorareis mas não com todas as vossas lágrimas.
O amor só se dá a si e não tira nada senão de si.
O amor não possui nem é possuído;
Pois o amor basta-se a si próprio.
Quando amardes não deveis dizer "Deus está no meu coração", mas antes "Eu estou no coração de Deus".
E não penseis que podeis alterar o rumo do amor, pois o amor, se vos achar dignos, dirigirá o seu curso.
O amor não tem outro desejo que o de se preencher a si próprio. Mas se amardes e tiverdes desejos, que sejam esses os vossos desejos: Fundir-se e ser como um regato que corre e canta a sua melodia para a noite. Para conhecer a dor de tanta ternura. Ser ferido pela vossa própria compreensão do amor. E sangrar com vontade e alegremente.
Despertar de madrugada com um coração alado e dar graças por mais um dia de amor.
Repousar ao fim da tarde e meditar sobre o êxtase do amor;
Regressar a casa à noite com gratidão. E depois adormecer com uma prece para os amados do vosso coração e um cântico de louvor nos vossos lábios.”