Sobre o valor da estética

Ontem eu vi um programa na TV em que era noticiada, através do relato de uma menina, a realidade das pessoas que são afetadas por anorexia, e me lembrei de outra reportagem que fala sobre o abuso de anabolizantes. Lembrei também da demanda que há hoje em dia para tratamentos de estética, seja os cirúrgicos ou os “naturais”.

Não pude deixar de relacionar a grande valorização da estética como uma forma de criar uma “persona” atraente e esquecer da essência. Parece que o mundo de hoje está extrovertido de tal maneira que essas doenças sejam apenas um sintoma dessa doença, que deve ser tratada.

Os remédios também são vacina: A introversão e o pensamento. Com esse post eu pretendo demonstrar de que maneira a introversão e o pensamento podem efetivamente ser a solução para o problema. Além de emitir meu julgamento de valor sobre a estética.

Primeiro gostaria de definir o que entendo por introversão e por pensamento, para que não aconteçam equívocos de interpretação.

A introversão é o olhar para dentro. Observar nossas próprias qualidades ignorando a opinião alheia sobre elas. Através dessa introversão nós descobrimos quem somos. Não é justo pensar que o introvertido é “melhor” do que o extrovertido: Introversão e Extroversão são funções que têm sua utilidade, e o erro é escolher entre uma delas.

Se a pessoa for só introvertida, ela projetará no mundo sua realidade. Criará paradigmas que explicam sua própria essência e dirá que esses são os que englobam todas as coisas e todas as pessoas, quando isso é visivelmente absurdo. Apesar de ser boa com lidar consigo mesma, a pessoa que vive no pólo introvertido tende a não ser boa com o convívio social.

Se for só extrovertida poderá cair em diversas armadilhas, dentre as quais estão as que vou falar nesse post, mas o mais importante aqui é que os extrovertidos se dão muito bem no convívio social, e lidam de forma razoável com os outros, mas não consigo mesmos. Ao invés de tomarem sua essência e projetarem no mundo, projetam o mundo na essência. Assim, o extrovertido se define segundo os rótulos externos: sou um professor, empresário, pai, marido, etc. e acaba, no final das contas, sem saber quem é.

Só se alcança a plenitude quando se está integrado, e o introvertido não é integrado. E também só se pode ser pleno quando se é livre, e o extrovertido não é livre. Assim, deve-se extroverter e introverter em igual proporção, já que cada função tem sua utilidade(conhecer-se a si mesmo e ao próximo, além de amar-se a si mesmo e ao próximo).

Nosso corpo tende a nos alarmar com dores sentimentais sobre nossos erros, e se insistimos essas dores se tornam físicas. É como se nós estivéssemos com a alma doente, que precisa ser tratada.

Vou deixar para falar dos males do introvertido noutro tópico, pois neste vou me ater à estética e em sua relação com introversão e pensamento.

O pensamento, em geral, coexiste com o sentimento, pois dentro de nós há o racional e o irracional. Pessoas separam as funções e as consideram inconciliáveis, mas eu nunca vi sentido nisso. A mim parece que, tal como a Introversão e a Extroversão, Pensamento e Sentimento são apenas funções diferentes. O pensamento existe para julgar as questões relevantes ao pensamento, e o sentimento para viver o aspecto emocional/irracional da vida, que tem tanto direito de existir quanto o racional e controlado.

Em geral, se estamos apenas com a função de pensamento, cometemos disparates grosseiros nas relações amorosas, pois criamos critérios racionais que nosso interior não respeita, e ficamos tentando segui-lo. Muito cometem o erro de achar que critérios racionais podem definir que musica é boa, que poesia é boa ou, nos casos mais gritantes, de achar que critérios racionais podem servir para a escolha de parceiros amorosos, como se o amor fosse uma coisa pensada e refletida e não sentida. Achar que é possível existir e mesmo ser imparcial reprimindo os sentimentos é um erro. Eles saem de qualquer maneira, com a diferença de que a negação os camufla.

Se estivermos apenas com a função do sentimento é comum emitirmos julgamentos muito equivocados. Pode-se dar razão a uma pessoa numa discussão pelo fato de ela ser gentil, ao invés de considerar a argumentação com sua relevância lógico-fatual. Uma pessoa que só usa os sentimentos e ignora o pensamento é facilmente manipulada, e fatalmente se frustra com o fato de que “as aparências enganam”. Se prende sentimentalmente á preconceitos (sejam introvertidos ou extrovertidos) e se nega a mudar de opinião.

Parece lógico que há coisas que são apenas vividas com o sentimento, tais como preferência musical, coisas que são vividas sentimentalmente e julgadas racionalmente ao mesmo tempo, tais como o amor, e coisas que são apenas entendidas, como conceitos filosóficos.

Para essa questão deve-se abordar o tipo extrovertido sentimental.

A menina extrovertida sentimental tem o mundo externo como referência, e assimila os sentimentos dos outros para si. O sentimento em questão é o de que a pessoa vale o que aparenta. Aí caímos também num preconceito grosseiro de nossa época, que diz que mulheres magras são mais bonitas, o que é um tremendo absurdo. Não vejo qualquer beleza em modelos raquíticas. Mas o preconceito é esse, e a menina extrovertida sentimental, num dado momento, percebe que sua imagem não se adequa ao padrão de fora. Hoje em dia o padrão é estético, então, vendo as modelos, ela decide não comer para emagrecer. O hábito se torna compulsivo e a menina se torna anoréxica.

Parece bem simples que, se ela refletisse (pensamento) sobre quem é (introversão) ela perceberia que não há necessidade de se moldar segundo o modelo dos outros.

É bom lembrar que a estética preocupa mais os tipos sensitivos por questões óbvias, já que estes se preocupam mais com as coisas palpáveis, enquanto que seu oposto, os intuitivos, se preocupa mais com coisas abstratas. Portanto, se formos falar em tipos psicológicos de Jung, poderíamos dizer, ao menos em teoria, que os tipos mais afetados são os Extrovertidos, Sensitivos Sentimentais(ESF). Não abordei a dicotomia intuição/sensação porque não acho que conceitos abstratos tenham qualquer utilidade nesse caso, pois a questão é estética, e estética só pode ser avaliada através de sensação.

O mesmo acontece com os homens que usam anabolizantes e hormônios de animais: Sacrificam sua saúde, sua mobilidade e sua individualidade por um ideal de que homens devem ser fortes e grandes. É lamentável que um preconceito desses ainda exista no século 21, e o sintoma dessa percepção doentia do mundo é o abuso de anabolizantes, que geram aberrações estéticas tão repulsivas quantos as anoréxicas raquíticas.

A plástica funciona sobre a mesma lógica, sendo apenas o risco e o sacrifício menores, e o resultado é menos repulsivo, embora nunca seja como a estética natural.

Todo esse post me leva a uma inevitável pergunta:

Afinal, qual é o valor da estética?

Penso que a percepção estética é extremamente variável, de forma que dificilmente se podem estabelecer padrões racionais do que é bonito e do que é feio e mesmo de como uma pessoa deve ser para ser atraente.

A função dessa percepção é o estímulo: quando estamos num relacionamento romântico, é inegável, a estética tem um poder grande, mas não há sentido em dar-lhe valor excessivo, como o fazem.

Já ouvi coisas absurdas, como: “ele que perdeu, veja só como ela é bonita”. Um preconceito grosseiro que atribui à pessoa o valor de sua aparência, e não considera as questões mais profundas de um relacionamento, que são muito mais determinantes do que a estética. Até porque, a estética se torna rapidamente redundante e a atração, que deveria se renovar por fatores internos, não se renova através da estética.

Um relacionamento romântico presume uma certa quantidade de estética, contanto que essa estética seja um padrão pessoal e não um padrão imposto de fora. Não há como mantermos uma relação amorosa com uma pessoa que tem a aparência que nos é repulsiva. Mas o essencial não está aí: Está na sintonia, na afinidade. Se há amor, há sintonia de sentimentos, e também deve haver sintonia de pensamentos (ligeiramente menor) que resulta da amizade. Isso é o essencial, não a estética.

As anorexicas e os “marombados” de preocupam tanto com a estética que se tornam esteticamente repulsivos, como uma forma de o corpo reagir a isso. É a alma deles criando uma doença para explicar que esse não é o caminho correto. Buscando um ponto de equilíbrio.

A estética se vai rapidamente, e é apenas mais um dos agrados da vida.

Se alguém cair no erro, no entanto, de negar o valor da estética, viverá em conflito consigo mesmo, pois, apesar de pequena, essa é uma parte da vivência humana que não pode, em qualquer circunstancia, ser negligenciada em favor de uma ideologia.

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